sexta-feira, 24 de dezembro de 2010

Palpites Oitavas-de-final Champions League

Depois de ter acertado 15 dos 16 classificados as oitavas de final da Champions League sendo traído apenas pela classificação surpreendente dos dinamarqueses do Copenhague (apostei no Rubin Kazan) eis aqui meus palpites para essa fase decisiva da maior competição de clubes do mundo.

Roma vs Shakhtar Donetsk: aposto na recuperação do time capitalino que, após um início de temporada lamentável, encontrou o seu rumo e vem jogando bem.

AC Milan vs Tottenham: o time de Redknap faz uma campanha brilhante nessa temporada tanto na liga inglesa enquanto na Champions League onde venceu um grupo que contava com o atual campeão Inter Milan. Um excelente nível coletivo aliado a grandes destaques individuais como a revelação Bale faz com que o time londrino seja o meu favorito no confronto com o gigante italiano.

Valencia vs Schalke: apesar dos reforços de nome o time alemão não conseguiu ainda demonstrar bom futebol e chegou a ocupar por muitas rodadas a zona de rebaixamento do campeonato alemão. Conseguiu a classificação e terá pela frente um time que, apesar de ter perdido seus principais jogadores, conseguiu manter uma estrutura competitiva e é meu favorito para conseguir a classificação.

Inter Milan vs Bayern Münich: no confronto mais atrativo das oitavas, o atual campeão mundial enfrenta o atual vice-campeão europeu em uma espécie de revanche da final da temporada passada. A equipe italiana vem muito mal na temporada o que me faz apostar no gigante bávaro que tampouco vem bem, mas que é meu candidato devido à qualidade individual de seus jogadores.

Lyon vs Real Madrid: dessa vez aposto que a touca francesa será jogada no lixo. O time de Mourinho, excetuando-se o massacre do Camp Nou vem demonstrando excelente nível nessa temporada e não deverá encontrar maiores dificuldades para eliminar os franceses.

Arsenal vs Barcelona: pobre do Wenger e companhia, mais uma vez caíram nas garras catalãs. Dá Barça brincando.

Marseille vs Manchester U: o time de Ferguson parece ter encontrado o seu futebol e deve passar com certa tranquilidade pelo maior clube do país rival.

Copenhague vs Chelsea: o clube dinamarquês foi a surpresa maior entre os classificados e o responsável por evitar meus 100% de aproveitamento nos palpites dos classificados da primeira fase. Chegou longe demais. Por mais que o Chelsea esteja em uma fase hedionda, deve garantir a classificação com facilidade.

quinta-feira, 23 de dezembro de 2010

O Regulamento

Muitos amigos leitores manifestaram inquietude com os critérios do meu ranquim mais uma vez divulgado com suas devidas atualizações. Como são ou esquecidos e/ou preguiçosos, não lembram ou/nem procuraram divulgações anteriores com todos os critérios devidamente explicados. Pela segunda e última vez o farei. Guardem bem o mês dessa publicação: dezembro 2010. Para que não esqueçam, tentei associar a data como o mês em que, pela primeira vez um time africano disputou uma final de Mundial Interclubes. Falando nisso, os colorados que tanto gostam de adicionar a palavra “FIFA” ao final do seu título de 2006, será que não seria melhor que o Mundial seguisse sendo disputado como era antes? Caso assim fosse o glorioso Campeão de Tudo teria sim jogado o jogo tão sonhado contra a Inter Milan fazendo valer o investimento de milhares de torcedores e ainda por cima, em caso de derrota, estaria livre de gozações devido à importância do adversário e de seu poderio. Mas não foi.

Hoje em dia é FIFA e um time pode ser campeão do mundo jogando apenas contra o campeão sul-coreano e o Mazembe.

Bom, vamos ao que de verdade importa: os meus critérios, mais justos impossível.

As pontuações distribuídas são as seguintes:

Mundial Interclubes: 25 pontos;

Libertadores e Champions League: 20 pontos;

Campeonatos Brasileiro, Argentino, Italiano, Alemão e Inglês: 15 pontos;

Campeonato Espanhol: 11 pontos;

Copa dos Campeões da África, da Ásia, da CONCACAF e da Oceania: 9 pontos;

Campeonatos Francês, Holandês, Uruguaio e Português: 8 pontos;

Campeonatos de outros países europeus e sul-americanos: 4 pontos;

Campeonatos de outros países da África, Ásia, Oceania e CONCACAF: 3 pontos.

Os países que têm dois campeonatos independentes por ano como Argentina e Chile têm sua pontuação dividida. O campeão do Apertura e do Clausura argentinos por exemplo ganham, cada um, 7,5 pontos e a mesma lógica vale para títulos divididos entre dois ou mais clubes.

Bom, a escolha da pontuação é o único momento de meu ranquim que pode ser questionado, o resto é impecável.

Há algum fator que não seja taça no armário? Não, o ranquim é organizado por um gremista a quem somente interessa título e que ignora fatores abstratos como posição em ranquins obscuros, tamanho de estádio, maior torcida, títulos invictos, marketing ou etc. Muitos estranham a posição do Barcelona, mas se analisarmos friamente, apesar de toda a onda, é um clube que conquistou a Europa “apenas” três vezes.

Quem participa do processo de ranqueamento? Todos os clubes de todos os países cujas seleções nacionais já tenham participado de pelo menos 50% das edições das copas do mundo. São eles: Brasil, Itália, Alemanha, Argentina, México, França, Inglaterra, Espanha, Iugoslávia, Bélgica, Suécia, Uruguai, União Soviética e Tchecoslováquia.

A Alemanha já foi dois países e Iugoslávia, União Soviética e Tchecoslováquia não existem mais! Ok, mas os países que foram formados a partir desses dois países são incluídos como suas ex-nações porque de outra maneira, devido a sua “juventude” estariam em desvantagem em relação aos demais. Mas e se em uma copa dois ex-soviéticos classificam? Conta apenas como uma copa a mais no currículo de nossa fictícia União Soviética. Esse ano Eslovênia e Sérvia, ambos os países da extinta Tchecoslováquia disputaram a copa, mas apenas uma participação foi contabilizada na conta tcheca.

Essa medida é tomada com o intuito maior do ranquim: evitar distorções. Exemplo: O Linfield da Irlanda do Norte já foi campeão norte-irlandês mil vezes. Estaria, assim, muito bem posicionado no ranquim, mas é fato conhecido por todos que o futebol nesse país é pobre e com essa medida essas distorções são evitadas.

A Holanda tem nove participações em copas do mundo, por que Ajax, PSV e Feyenoord aparecem na lista?

Para evitar a impossibilidade de um clube forte de um país mais fraco entrar no ranquim, qualquer clube de qualquer país europeu ou sul-americano que venha a conquistar a Champions League ou a Libertadores entra no ranquim, apenas os clubes, não o país e é por isso que temos esse tridente holandês bem como Porto e Benfica entre outros.

E o brilhante Mazembe, é campeão continental, mas não aparece no ranquim! O continente do Mazembe é a África, um continente que jamais ganhou uma Copa e por isso não dá direito aos seus clubes de, no momento da conquista continental entrar por essa via no ranquim.

O Real Madrid tem nove Champions Leagues, por que aparece o AC Milan como o maior vencedor? Resposta: evitar, mais uma vez, injustiças.
Como a Libertadores começou a ser disputada em 1960, contamos somente os campeões europeus a partir desse ano. O mesmo vale para os campeonatos nacionais. O Brasil foi o último país ranqueado a ter um torneio nacional organizado em 1967. Assim sendo, contamos todos os torneios nacionais a partir de 1967. O quê evito com isso?

Uma imparidade dos países mais antigos como a Inglaterra, que possui seu campeonato estruturado desde o fim do século XIX.

Por que as copas não estão incluídas? Em primeiro lugar porque não há essa competição em alguns países, na América do Sul, por exemplo, somente o Brasil tem e é ainda muito recente e agora a Colômbia. Além disso, são competições que causariam distorções porque são, em sua maioria, disputadas com desprezo pelos maiores clubes e causaria um crescimento enganoso de clubes com menos expressão.

Por que não são considerados títulos secundários como Europa League, Sul-Americana, Recopa e etc? Porque seria premiar o fracasso. Um time que disputa a Europa League ou a Sul-Americana fracassou na temporada anterior e não conseguiu sequer uma vaga para a principal competição do continente. O Bayern Münich, por exemplo, perdeu a final da Champions League com a Inter Milan, ficou com zero ponto por isso e daí o Atl Madrid, que não conseguiu nem ficar entre os quatro melhores da Espanha ganhou a Europa League e ganha pontos? Negativo. São torneios caça-níqueis que premiam o fracasso.

A Recopa a mesma coisa, pois dá a chance de o campeão da “segunda divisão” continental ser premiado. Em poucas palavras, seria o mesmo que dar pontos para os campeões das séries B, C, D...

Esclarecido. Quem quiser o ranquim completo com os 290 clubes ou quaisquer outros dados como número de clubes por países, número de clubes por países entre os 50 maiores, maiores clubes de cada país, ranquins nacionais, ranquins continentais ou ranquins das ligas, é só pedir que chega de graça e sem custo de frete.

sábado, 18 de dezembro de 2010

Meu Ranquim Atualizado

Duas vezes por ano eu divulgo a atualização do melhor ranquim de clubes do mundo, o meu. A cada final de temporada europeia que é representada com a final da Champions League e cada final de Mundial Interclubes, novos números são divulgados. Geralmente não há grandes alterações, mas é importante a escalada da Inter Milan e a entrada da LDU no grupo dos maiores clubes do futebol mundial.

Abaixo o ranquim dos 50 maiores clubes do futebol mundial e devidas pontuações: são 17 representantes da CONMEBOL, 31 clubes filiados à UEFA e dois clubes da CONCACAF.

1. Bayern Münich (Alemanha) – 445
2. Real Madrid (Espanha) – 395
3. AC Milan (Itália) – 390
4. Peñarol (Uruguai) – 327
5. Juventus (Itália) – 315
6. Boca Juniors (Argentina) – 300
7. Manchester U (Inglaterra) – 290
8. Ajax (Holanda) – 274
9. Inter Milan (Itália) – 270
10. Liverpool (Inglaterra) e Independiente (Argentina) – 265
12. Nacional (Uruguai) – 263
13. Porto (Portugal) – 242
14. River Plate (Argentina) – 230
15. São Paulo (Brasil) – 225
16. Barcelona (Espanha) – 217
17. Benfica (Portugal) – 184
18. PSV (Holanda) – 156
19. Olimpia (Paraguai) – 147
20. Santos (Brasil) e Estudiantes (Argentina) – 135
22. Estrela Vermelha (Sérvia) – 121
23. Flamengo (Brasil) – 120
24. Palmeiras (Brasil) e Internacional (Brasil) – 110
26. Vélez Sarsfield (Argentina) e Dynamo Dresden (Alemanha) – 105
28. Dinamo Kiev (Ucrânia) – 96
29. Grêmio (Rio Grande do Sul) – 95
30. Celtic (Escócia) – 94
31. Feyenoord (Holanda) – 93
32. Arsenal (Inglaterra) e Dortmund (Alemanha) – 90
34. Steua Bucarest (Romênia) – 88
35. Colo-Colo (Chile) – 84
36. Vasco (Brasil) e Sparta Praga (República Tcheca) – 80
38. Marseille (França) – 76
39. Borussia MG (Alemanha) – 75
40. SC Anderlecht (Bélgica) – 72
41. Atl Madrid (Espanha) – 69
42. Partizan Belgrado (Sérvia) – 68
43. América (México) – 67,5
44. Hamburg (Alemanha) – 65
45. Cruz Azul (México) – 64,5
46. Saint-Etienne (França) – 64
47. Corinthians (Brasil) e Rosario Central (Argentina) – 60
49. LDU (Equador) – 58
50. Lyon (França) – 56

Rosario Central e Dynamo Dresden são os únicos clubes posicionados entre os 50 maiores que não disputam as divisões especiais de seus países atualmente. O Rosario Central foi rebaixado na temporada passada enquanto que os alemães disputam a terceira divisão germânica.

O clube com mais títulos mundiais é o AC Milan com quatro conquistas; os maiores campeões continentais são AC Milan e Independiente, cada um com sete taças europeias e sul-americanas respectivamente. O maior campeão nacional é o maior clube do mundo, o Bayern Münich, 21 vezes campeão alemão.

Em toda a lista estão ranqueados 290 clubes de 39 países.

O país que mais clubes possui no ranquim é a Lituânia com 20 clubes. Brasil e México ocupam a segunda colocação com 17 clubes entre os 290 ranqueados cada. No entanto, entre os 50 maiores clubes do mundo, o país com mais representantes é o Brasil com oito seguido por Argentina com seis e Alemanha com cinco.

No ranquim brasileiro, o líder é o São Paulo seguido por Santos e Flamengo.

Analisando as ligas, a mais competitiva é a argentina seguida pelas ligas brasileiras e italianas empatadas na segunda posição.

sexta-feira, 3 de dezembro de 2010

Porto Alegre x Medelín

Fazia muito tempo em que não passava um período tão grande sem vir a Porto Alegre desde que me mudei para Medelín. Quase um ano se passou sem eu tocar o solo gaúcho.

Esse período mais longo longe da cidade conforma uma melhor posição para uma análise das diferenças notadas na cidade e torna fértil o campo de uma análise que farei mais uma vez: as diferenças de viver em Porto Alegre e Medelín, o que é melhor ou pior em cada uma dessas cidades tão drasticamente diferentes.

Minha relação com Porto Alegre é conturbada, instável, de amor e ódio. Sempre gostei muito de Porto Alegre e, influenciado pelo sentimento bairrista local, poderia dizer que amava Porto Alegre. O fim desse amor, ou melhor dizendo, a primeira desilusão amorosa foi quando fui para Londres em 2005 para lá ficar por um período de dois anos. É inevitável a comparação do estilo e modo de vida das duas cidades.

Evidentemente já havia saído do país antes disso inclusive tendo ido como turista à Londres, mas viver em uma cidade é diferente de fazer turismo; o dia a dia torna possível a comparação enquanto que o turismo apenas oferece análises rasas de realidades diferentes.

Voltei de Londres e passei a odiar Porto Alegre. Sentia falta da segurança, do sistema de transporte excelente, mas, antes de tudo, sentia falta da beleza presente em todos os lugares e do fator rua. Em Londres eu expendia meu tempo livre na rua; em Porto Alegre, devido a nossa cópia errônea de um estilo de vida americano, não temos na rua um lugar agradável de lazer guardado alguns pontos de exceção na cidade.

Agora tenho um endereço em uma terceira cidade e, em todas as minhas visitas a Porto Alegre que havia feito, todas muito rápidas, quando chegava aqui sentia aquele amor adolescente voltando aos poucos já que comparava Porto Alegre com Medelín, uma cidade que aprendi a não gostar.

Agora a visão e análise é outra. Farei uma comparação da qualidade de vida nessas duas cidades dividida de maneira não tão organizada em três partes: análise das duas cidades, análise dos hábitos e do povo local, algo que para mim é fundamental na qualidade de vida de qualquer região e depois uma análise mais complexa que abrange o meu ambiente em cada lugar, essa “microrregião”, ou melhor dito, esse “microcosmo” que eu faço parte. Ao final uma conclusão que nada conclui.

Tanto Porto Alegre quanto Medelín são cidades feias. No entanto, na região mais rica da cidade em Medelín onde vivo, é um ambiente extremamente agradável. Ainda há pedaços de bosques nativos e pode-se dizer que é uma cidade à parte onde tudo é bonito e agradável. Fora dessa região, uma cidade simplesmente monótona e igual, mas sempre com a intensa presença do verde. Porto Alegre tem uma organização social distinta e curiosa. A maioria pode se impressionar, mas a organização social da capital gaúcha é muito semelhante a do Rio de Janeiro. Ambas são cidades em que pobres e ricos vivem muito perto. Onde termina um bairro de classe média alta em Porto Alegre inicia um bairro pobre. Essa organização faz com que não existam regiões como a que eu vivo em Medellín, pois em Porto Alegre a mistura é sempre notória.

Medelín é uma cidade sectária. Da classe média para baixo todos vivem ou no centro da cidade ou nas montanhas que rodeiam a cidade. É uma organização urbana semelhante à de São Paulo com suas periferias bárbaras. Em Medelín não há pobres em bairros ricos e vice-versa. Em Medelín não há espaços públicos de lazer como há em Porto Alegre. Não há parques nem um lago com uma orla como a do Guaíba que torna um bairro como Ipanema uma atração turística para as camadas populares que não podem pagar por lazer. No meu bairro em Medelín, o mais caro e bonito da cidade, não há parques nem um lago. Em muitas partes do bairro não há nem calçada o que torna essa área apenas propícia para os carros, mais ou menos no estilo Los Angeles ou Miami. As classes mais abastadas vão, nos seus carros, aos incontáveis xópins e centros comerciais que se espalham pelo bairro e consomem, gastam dinheiro. As classes populares, sem tanto poder aquisitivo, são obrigadas a ficarem em seus bairros onde podem consumir em estabelecimentos adequados aos seus orçamentos. Soma-se a ausência de um verdadeiro sistema de transporte que torna a ida de essas populações aos bairros mais ricos mais difíceis.

Essa situação faz com que esse meu bairro esteja sempre agradável: limpo e sem vandalismos enquanto que bairros porto-alegrenses como Ipanema sejam devastados pela marginalia que baixa nos fins de semana e pelos próprios moradores vândalos que vivem muito perto e de forma muito acessível dos bairros mais nobres.

Muito mais diferente do que as cidades em si, as populações dessas duas localidades se diferem em gênero, número e grau. Um cambojano é mais semelhante a um gaúcho do que um cara de Medelín. Exageros à parte, há inúmeros fatores que fazem com que os porto-alegrenses sejam tão distintos aos cidadãos de Medelín. Para começo de análise o fator mais antagônico entre esses dois grupos é o humor e a educação, ou melhor dito, o que significa “educação” em cada um desses rincões. O povo da capital de Antioquia entende que é educado cumprimentar a todos e com um jogo de palavras que seria visto como um excesso para os gaúchos e que era excessivo para mim quando lá cheguei. Tive que adaptar minha forma de interagir para não ser taxado de mal educado. Depois de um ano longe de Porto Alegre, confesso que me sinto insultado quando me vejo envolvido em uma interação banal entre duas pessoas ou mais desconhecidas. Não há “bons dias” nem “boas tardes” e é difícil de encontrar simpatia. Os gaúchos atuam de forma brusca e direta enquanto que os colombianos atuam sempre de uma forma que ao princípio pode parecer falsa, mas depois se revela ser extremamente natural.

No entanto toda essa formalidade também tem seu lado negativo. É raro encontrar nas relações humanas colombianas um grau de intimidade que esteja acima de qualquer regra de convívio social. Não há a extremada intimidade nem entre amigos nem entre familiares o que me causa certo desconforto.

Deixando as formalidades de lado, vamos aos hábitos e a primeira grande divergência entre os dois grupos analisados é a diversidade de personalidades dos gaúchos e a uniformidade colombiana. Na Colômbia as pessoas são tão iguais, gostam tanto das mesmas coisas que arriscaria a dizer que ricos e pobres gostam e desfrutam das mesmas coisas. No Rio Grande do Sul é exatamente o contrário. Os gaúchos são sectários em relação a hábitos dependendo da classe social. Isso é bom ou ruim? Depende. Eu preferiria que todos fossem iguais como na Colômbia, mas com os meus gostos o que é impossível. Se fosse então obrigado a escolher uma forma social melhor, ficaria com a gaúcha, pois dá a chance de se ter grupos de pessoas diferentes que usufruem e consomem coisas distintas. Vou tentar colocar na prática através de exemplos.

Em Medelín todos os cidadãos gostam apenas de músicas típicas locais. Esse comportamento demonstra algo mais do que o óbvio. Em Medelín não há o interesse em buscar, procurar, questionar. Tudo é aceito. Ouve-se o que o rádio oferece. Em Medelín todos acham que o ápice da diversão de um ser humano é reunir-se com amigos ou parentes em uma casa no meio das montanhas, ouvir música sertaneja e beber cachaça até a inconsciência. Aliás, a cachaça tem que estar presente sempre. Não há confraternização interpessoal em que a cachaça não esteja presente. Outra vez: esse dado tem mais significância do que o que transparece num primeiro momento. A limitação intelectual do povo que resulta em um senso de humor deplorável faz com que a reunião de pessoas se torne insuportável sem a presença de um elemento que altere suas percepções e aí que entra a cachaça.

O quê o pobre e o rico fazem em um fim de semana em Medelín? Vão para uma casa de campo embriagar-se ouvindo sertanejo e fazendo sopão no pátio.
Em Porto Alegre o sectarismo de classes é gritante. Quem ouve sertanejo em Porto Alegre? Os pobres. Quem bebe cachaça? Os pobres. As classes mais abastadas têm hábitos completamente diferentes e soma-se a esse comportamento o fator cosmopolita dos cidadãos de classes médias e superiores em Porto Alegre. Todos se interessam por artistas de outros países. Todos têm interesse em viajar, buscar novos destinos enquanto que os pobres seguirão sempre na sua mesmice consumindo o que o rádio os oferece, o que a grande mídia quer que eles consumam, exatamente como acontece em Medelín com a diferença de que lá isso funciona com todo mundo.
Mas nem tudo são flores em Porto Alegre. É difícil de encontrar em Medelín seres tão repugnantes como vemos em cada esquina por aqui. Os homens de Medelín são, como já citei em muitos textos anteriores, muito semelhantes em hábitos aos habitantes do interior de São Paulo, Minas Gerais e Goiás: gordinhos esturricados em roupas pseudo-féxions e adoradores de música sertaneja e que vêem o Estados Unidos como o lugar mais bacana do planeta, com destaque para Miami e Las Vegas. No entanto, é difícil de encontrar em Medelín os nossos babacas de plantão, aqueles caras que acham que o tamanho de seus músculos é a coisa mais importante do mundo, que praticam jiu-jítsu e que vão à praia de sunga arder em uma fogueira de vaidades e de preferência encontrar alguém para brigar como um pitbull. Em Medelín são menos. Os que se interessam pelo corpo são os homossexuais enquanto os gordinhos sertanejos exibem suas barrigas inchadas de cachaça com certo orgulho.

E o meu microcosmo, a última parte da análise, o quê é isso? Simples, é o mundo à parte em que eu vivia em Porto Alegre e que é composto por pessoas que me acompanham há mais de 10 anos no mínimo. Caras que ficam de mau humor caso a música seja ruim. Caras que desfrutam uma noite de sexta-feira ou de sábado na frente de uma churrasqueira sem necessidade alguma de consumir álcool e que tem em seu ponto mais forte e apreciável a capacidade de falar besteiras ou abordar um assunto mais sério com o mesmo humor inteligente que torna qualquer tema agradável. É bom passar uma noite de quinta ou sexta jogando um jogo de tabuleiro ou vendo um filme na casa de um amigo na paz, sem necessidade de excessos, apenas desfrutando da companhia de cada amigo eterno. Esse microcosmo construído ao longo da vida e composto por integrantes selecionados a dedo é impossível de ser recriado.

Prometi uma conclusão, mas alertei que essa poderia concluir nada ou muito pouco. Qual cidade é melhor? Difícil de dizer. Eu não gosto de nenhuma das duas, e não sei se posso considerar alguma delas superior. Uma ganha em determinados quesitos, mas perde em outros. Medelín é mais bonita em sua área fora das montanhas, mas Porto Alegre é mais rock and roll, é mais rica culturalmente, mais diversa, multicultural, ainda repleta de personagens; em Medelín não há tantas figuras extremamente babacas, mas todos são simplórios, comuns, sem senso de humor e obsessivos com a aparência. O quê é melhor: um time com 7 jogadores terríveis e 4 craques ou um time com 11 jogadores medianos?

Em Medelín não há espaço para a diferença, em Porto Alegre somos obrigados a viver juntos com a diferença o que é extremamente desagradável. Em Medelín o trânsito é caótico e os motoristas se comportam como verdadeiros bárbaros enquanto que na capital gaúcha pode-se dizer que o trânsito é civilizado. Em Medelín rostos e corpos femininos são destruídos por hediondas e numerosas cirurgias plásticas; em Porto Alegre há nossas “belezas naturais” que, no entanto, são mal humoradas. Em Medelín, apesar de haver obviamente as mulheres da pá virada, há grande quantidade de boas mulheres enquanto que em Porto Alegre venera-se a promiscuidade. Em Medelín ninguém fuma enquanto que em Porto Alegre muita gente ainda fuma, especialmente as mulheres e até algumas de nossas belezas naturais fumam e perdem a sua aura de imediato.

A solução então seria morar em Paris ou Londres, com os preços de Quito e com as mulheres suecas, comida brasileira, amabilidade de Medelín, ironia, clima e rock and roll britânicos, filosofia francesa, caráter alemão, fibra polaca, chocolates belgas e suíços, honestidade escandinava, demência e futebol argentinos, tranquilidade uruguaia meus irmãos e amigos ao lado e com minha pequena grande mulher me vendo envelhecer.

PS: para quem leu o texto “Quito”, descobri o número de colombianos que vivem no Equador: 500 mil. Explicado porque eu vi tantos cafeteiros por lá.

quinta-feira, 11 de novembro de 2010

Quito

A minha primeira percepção do Equador depois de estar vivendo já há quase dois anos na Colômbia foi que são dois países muito diferentes apesar da proximidade. Esperava encontrar enormes semelhanças, mas estas são menos do que eu tinha em mente.

O fator de maior diferencial entre os dois países é o comportamento das pessoas. Não sei se fiquei muito exigente quanto à amabilidade dos povos depois de estar a tanto tempo em Medelín, mas o fato é que a população de Quito é mais fria e em muitas situações mal educada e mal humorada. A questão da maior frieza dos cidadãos de Quito confirma minha teoria sobre a influência do clima nas pessoas. Em Quito a temperatura dificilmente passa dos 25 graus e, pela noite, chega a nove ou 10 graus em média.

Não se pode dizer que as pessoas em Quito sejam ranzinzas. Em muitos pedidos de informação recebi bom trato, mas não há aquele carinho excessivo dos colombianos que se aflora ainda mais quando se é estrangeiro. Senti falta de ser chamado de “meu amor” por qualquer senhora nas ruas ou em qualquer estabelecimento comercial. Os equatorianos, e quando digo “equatorianos” me refiro às pessoas de Quito, são de poucas palavras, poucos sorrisos e sim ajudam, mas com uma informação básica e jamais ajudam mais do que o que foi perguntado. É comum receber respostas curtas e grossas, como um sim ou não. “Tu sabes onde é a entrada ao estádio?”. A resposta é “não”, bem assim, curtos e grossos.

As semelhanças com a Colômbia aparecem, infelizmente, na música. Escuta-se a mesma porcaria do que na Colômbia e o reggaeton existe, mas não é tão popular. Outro fato interessante quando comparamos esses dois países e o grande número de colombianos em Quito. Há em grande quantidade e por todos os lados. É comum encontrar-se padarias e restaurantes que servem comida colombiana.

No entanto, além de colombianos, Quito é repleta de árabes, chineses e indianos. Muitos fazem a mesma coisa que seus compatriotas em países de primeiro mundo: são donos de restaurantes de comida típica. Na esquina de meu hotel havia um restaurante de afegãos e desde minha primeira noite tive contato com vários grupos de árabes. Chineses por toda a cidade também em sua maioria donos de estabelecimentos de alimentação. Aproveitei essa presença árabe para matar as saudades da pita, falafel ou shawara, nunca lembro das diferenças entre eles, mas gosto de todos. Carne espetada girando em frente a um forno na vertical dentro de um pão árabe com iogurte, alface e molho de alho. Simplesmente excelente e ao custo de um dólar e meio.

Falando em preços, o Equador é um país que tem o dólar americano como sua moeda oficial. Não sei se por isso ou por qualquer outro motivo, mas esse pequeno país deve ser o mais barato do continente para comer fora. Come-se um prato com camarão, frango, carne, corvina ou etc por menos de dois dólares. Os restaurantes da área turística oferecem pratos entre cinco e sete dólares. Ainda falando em comida, esse seria outro grande diferencial entre Colômbia e Equador. Come-se extremadamente bem no Equador, não apenas considerando os baixos preços, mas sim a excelente qualidade da comida. A comida típica de Quito não é o famoso ceviche que é da costa equatoriana; em Quito o prato mais tradicional é um caldo de pata, algo que soa detestável e deve ser, pois não provei por pura falta de interesse em sopas e caldos; queria provar o cuy que é uma carne de um roedor, mas é difícil de encontrar. Come-se muitos mariscos, camarões e frutos do mar em geral, mas recomendo provar os produtos como pães, bolachas e tortas das padarias da cidade que são de excelente qualidade.

Para destacar dois lugares em especial, vou de Café Español e La Boca del Lobo. O primeiro é uma mescla de café com delicatessen. Oferecem uma grande gama de presuntos espanhóis e excelentes queijos franceses e suíços. Chocolates e doces também estão presentes e todos de muita qualidade. O outro estabelecimento citado é o restaurante de decoração mais espetacular que já vi. É difícil de definir o seu estilo, mas eu diria que é uma grande mistura de estilos incompatíveis que têm como resultado uma aberração espetacular. Há móveis clássicos, luzes em neon, objetos decorativos de vidro, bonecos chineses, muitas cores, muito vidro e luzes, objetos místicos, candelabros etc. Sei que isso pode soar como o lugar mais cafona do mundo, mas é simplesmente uma ode ao kitch de estética única e genial.

Esses dois lugares se localizam em uma área conhecida como La Mariscal que era onde meu hotel ficava. É uma região repleta de turistas estrangeiros e com um clima extremamente agradável. Muitas lojas e principalmente bares, cafés e restaurantes conformam uma das áreas de entretenimento mais agradáveis em que já estive.

Destaques para o Mulligan´s e para a pouca presença de cadeias importantes como Mc Donald´s e Burger King que ficam atrás até mesmo de uma cadeia americana de restaurantes menos popular que é a KFC.

Infelizmente a população é assustadoramente horrorosa fisicamente. Em três dias não vi sequer uma equatoriana bonita. Os habitantes de Quito são massivamente muito indígenas, ou seja, indiozinhos anões e é comum ver mulheres de mais idade usando roupas típicas indígenas. Ainda abordando as características da população, é muito difícil encontrar um cidadão de Quito que não seja torcedor da LDU apesar de que a maior torcida do país é a do Barcelona de Guayaquil.

O trânsito de Quito também é outro ponto positivo da cidade. A capital do Equador possui uma geografia curiosa. É uma faixa retangular de três quilômetros por cinquenta e poucos. Vista de cima, é um corredor de concreto. No centro dessa tripa há duas grandes avenidas, uma direcionada a cada sentido e isso torna a cidade extremamente fácil de locomover para os turistas. É interessante a não-presença de motos o que torna o trânsito muito mais agradável e há um sistema de ônibus elétricos que cruzam a cidade extremamente eficiente e que custam apenas 0,25.
Os pontos mais interessantes da cidade são o seu centro histórico que é considerado o mais bonito do continente e onde eu tive a desagradável experiência de ter uma de minhas câmeras furtadas. Enquanto filmava um discurso do presidente Correa, algum rato equatoriano, notando a minha óbvia situação de turista se aproveitou de um deslize da bolsa da câmera em direção às minhas costas, abriu-a e levou a câmera sem eu nem me dar conta. Maldita América do Sul.

Falando no presidente equatoriano, é interessante notar a presença sutil de uma ultrapassada propaganda estilo comunista. Há alguns cartazes e mensagens louvando a luta do povo e seguidamente aparecem personagens históricos como Fidel Castro.
Outro ponto a ser visitado de Quito é a sua basílica, a mais alta da América Latina. É extremamente parecida com a Notre Dame parisiense e é, sem dúvidas, uma das mais bonitas que já vi. O curioso da basílica é a presença de estabelecimentos comerciais incrustados ao redor da nave principal. No próprio prédio ou ao redor da igreja vê-se inúmeros pequenos comércios inseridos de maneira extremamente peculiar.

Vale à pena também a experiência de subir no teleférico da cidade que leva o corajoso turista a 4.100 metros de altitude, ou seja, acima de muitas nuvens. Além de uma vista privilegiada de toda a cidade é uma oportunidade única de entender os fracos desempenhos de times sul-americanos quando jogam nas alturas de La Paz, Quito ou principalmente Cuzco. Uma caminhada mais rápida e o ar já começa a faltar.

Para completar os atrativos de Quito, é ponto obrigatório ir até o monumento do centro do mundo onde passa uma linha amarela, a tão famosa e badalada linha do Equador. Lá nessa localidade que fica nos subúrbios da capital em uma área cara e repleta de bonitas casas, pode-se fazer a experiência do ovo de Colombo e também ver a balança marcar menos quilos do que os de costume e tudo isso devido à diminuição da gravidade. Um comerciante local me disse que, quando chegaram ao local, os expedicionários franceses não contavam com a tecnologia de aparelhos como GPS e portando não sabiam exatamente onde era o ponto central do planeta, sabiam apenas que era por essa região e o monumento foi, então, construído na região do centro do mundo. Pois esse dono de um restaurante local já fez o teste com um GPS e verdadeiro centro do mundo fica em uma montanha da região visível desde o parque do centro do mundo. Seu plano era começar excursões que levariam ao “verdadeiro” centro do mundo.

Perto do parque do centro do mundo está localizada uma cratera do vulcão Pululahua habitada que é a maior do mundo. Entre montanhas e a 300 metros de profundidade 100 famílias cultivam suas hortas e vivem em um estilo extremamente pitoresco. Há energia elétrica proveniente da rodovia, mas não há sistema de águas e sinal de televisão. Uma escola abriga os mais ou menos 15 alunos e é cenário de uma história comovedora de amor ao ensino. Uma professora trabalhou nessa escola por nove anos.

Ia todos os dias de Quito até essa localidade e se via obrigada e descer diariamente os 300 metros e depois subi-los ao final das aulas. O único posto de saúde da comunidade foi fechado, pois era inútil devido à saúde de ferro de seus habitantes que jamais adoecem, pois têm uma vida extremamente saudáveis. Consomem alimentos que eles mesmos plantam sem qualquer uso de agrotóxicos, bebem água cristalina proveniente das montanhas virgens e não gastam horas em frente à televisão, pois se mantêm na lida do campo até o horário em que as nuvens tapam o vale e baixam a temperatura a zero grau. Essa mesma neblina aduba o solo e o torna muito fértil.

Atrás do povoado, passando uma montanha de 15 mil anos há uma reserva ecológica que abriga uma até pumas e ursos e que não pode ser habitada pelos humanos.
Grata surpresa gastronômica e esclarecedora de dúvidas e mitos foi Quito, uma cidade séria, fria e de poucos e bons atrativos.

terça-feira, 5 de outubro de 2010

Votos Célebres

Entre as tantas possíveis nomenclaturas que podem ser utilizadas para definir a era em que vivemos, uma delas poderia ser “A Era das Celebridades”. Muitos pensadores se referem ao nosso momento social atual como “modernidade”, outros como “pós-modernidade” e temos até a “hipermodernidade”. No entanto, todas essas definições devem ter obrigatoriamente a abordagem do fenômeno das celebridades.

Juntamente com o alto consumo de publicações de auto-ajuda, histórias de bruxinhos mágicos e de vampirinhos emos depressivos, se gasta um oceano Atlântico de tinta por ano para publicações que abordam as vidas espetaculares de celebridades, sejam essas nacionais ou internacionais. O cidadão médio e ordinário tem necessidade de sair de sua vida simples e medíocre e penetrar através do consumo de materiais desse estilo na vida glamorosa e fantástica das estrelas.

Um fenômeno que vem chamando a atenção de todos nos últimos anos é o sucesso das redes sociais, mais especificamente os saites Orkut, Facebook e Twitter, o mais novo da turma. A popularidade e a alta adesão a esses saites representam uma espécie de revolta dos seres ordinários que não mais aceitam sua condição periférica no mundo do espetáculo. Cidadãos comuns, cansados de obter prazer somente através dos órgãos genitais de famosos, resolveram criar o seu próprio ciclo do sucesso e exibem-se como celebridades em um meio em que sim são notados, vistos, comentados e bisbilhotados.

Basta cinco minutos de navegação por esses saites e veremos amostras infindáveis desse complexo de vira-lata célebre. Vemos fotos tiradas pelas próprias personagens das imagens. É comum a auto-foto ou a foto tirada em frente a um espelho por um cidadão sozinho em um recinto com seu computador que é sua porta para a fama. As mulheres chegam ao ponto de colocar uma roupa mais vibrante e tiram suas fotos para colocar no círculo da “mídia” amadora. Os homens não são menos carentes e/ou ridículos. Apostam geralmente em óculos escuros ou fotos com símbolos fálicos que revigoram sua pobre masculinidade como carros e motos. Tudo isso feito com a intenção de serem vistos, notados, adorados, serem motivo de comentários em seus micros cosmos. Nada é mais prazeroso atualmente do que ter muitos comentários em alguma foto ou, melhor ainda, ter muitos views em algum vídeo publicado no Youtube.

Via Twitter, os ex-excluídos do mundo garboso do espetáculo publicam suas ações minuto a minuto. “Estou no banho”; “Estou pensando na vida”; “Fazendo nada”; “Pensando na morte da bezerra”. Se a Lady Gaga ou a Angelina Jolie publicam algo assim na rede, seria interessante? Sim. Milhões de pessoas dedicariam pelo menos alguns segundos de suas vidas para pensar nos célebres no banheiro ou pensando na morte da bezerra. E agora, se eu, um reles mortal, publico algo assim, é interessante? SIM, agora sim, agora, via Internet, temos a democracia dos holofotes, é a rebelião dos anônimos.

Essa adesão massiva ao culto das celebridades chegou, infelizmente até os meandros da política brasileira. As eleições de 2010 poderiam ser nomeadas como a eleição das celebridades. O fenômeno demonstra a necessidade doentia que temos de sermos entretidos a todo o tempo. Necessitamos diversão, imagens e publicidade para sobreviver. A adição é tão forte que queremos esse entretenimento até na política.

Nas eleições 2010 que movimentaram mais de 130 milhões de pessoas pelo país afora, candidatos célebres foram eleitos. Para demonstrar o grau desse fanatismo idiota, os dois estados mais importantes do país tiveram como seus deputados federais mais votados, duas celebridades. O Rio de Janeiro elegeu, além de Romário, Wagner Montes que foi o favorito dos fluminenses; no entanto o mais votado entre todos, que recebeu voto de pelo menos 1% de todos os eleitores do país atingindo um número de 1,3 milhões de sufrágios, sendo, assim, o mais votado pelos paulistas foi o palhaço analfabeto Tiririca.

Por que acontece isso? Evidentemente que a ignorância é o motivo mais apontado por todos, mas há algo mais por trás. O quê os cidadãos brasileiros médios sabem sobre a vida de seus políticos? Muito pouco e não sei por quê dessa indiferença. A vida da maioria dos políticos é muito mais interessante do que a da maioria dessa figuras que citarei que, felizmente, não chegaram a serem eleitos, mas se candidataram.

Tivemos, entre outros: o pagodeiro Netinho que havia sido o deputado mais votado das últimas eleições, mas que não conseguiu a tão sonhada reeleição, talvez por ter sido flagrado desviando verba pública para sua instituição de “caridade” para consigo mesmo; Marcelinho Carioca, Vampeta, o jogador campeão do mundo que desceu rolando a rampa do Planalto bêbado depois de voltar do oriente e que pelo jeito gostou do cenário; Agnaldo Timóteo, Juca Chaves, Maguila, Popó, Simony, a musa do PCC, Joãozinho Trinta, um cidadão homossexual que ganha a vida através de uma profissão chamada “carnavalesco”, Reginaldo Rossi, Moacyr Franco, o comediante fracassado sustentado durante toda a vida pelo Silvio Santos, Rebeca Gusmão, a mulher-macho expulsa do esporte por uso de drogas, Eurico Miranda, o Al Capone ex-dono do Vasco que demonstrou que necessitava do cargo no futebol para seguir popular, Roberto Dinamite, Dinei, ex-jogador flagrado duas vezes em exames anti-dópins por cocaína, Ademir da Guia, Robgol, Túlio Maravilha e o técnico campeão do mundo pelo Grêmio Valdir Espinosa, além de alguns sertanejos, evangélicos, ex-participantes do Big Brother e esse brilhante triunvirato: Mulher Melão, Mulher Pêra e Tati Quebra Barraco. Quando abandonei esse país existia apenas a Mulher Melancia que, pelo que vejo, ou mudou de nome, ou procriou ou foi superada pela rapidez e efemeridade do mundo das celebridades local tendo seu trono arrebatado por suas seguidoras frutíferas.

Mas por que a vida privada dos políticos não atrai ao grande público? Enquanto que as celebridades são pegas com um cigarro de maconha, dirigindo bêbadas ou batendo em mulher, os políticos se envolvem em situações muito mais interessantes. Há uns flagrados colocando dinheiro nas meias e cuecas, outros que saem atrás de inimigos de moto-serra em mãos, outros governos se envolvem em assassinatos como no caso do governo Yeda, outros se besuntam em pornográficos mensalões, outros mandam a família cafona para as capitais da cafonice Miami e Las Vegas com as cotas das passagens parlamentares, outros são flagrados com modelo sem calcinha, outros violam o sigilo da conta bancária de seus porteiros, outros dão comícios acompanhados por traficantes em morros cariocas, outros são salvos pelo gongo da proibição de prisão antes das eleições por comandarem redes criminosas mesmo sendo parte do corpo da Polícia Militar, há inclusive escândalos matrimoniais como na família Suplicy que, aliás, tem um filho celebridade, há escândalos sexuais como desse candidato do norte, Pará acho, que foi acusado de acosso sexual contra suas funcionárias, outro já desfilou por Copacabana fardando apenas uma sunguinha diminuta feita de crochê, governos envolvidos com contrabandos de selos, gente ganhando 200 vezes na loteria, enfim, histórias sensacionais sobram, abundam, mas, por motivos que desconheço, não atraem tanto a atenção do grande público. Será porque os políticos são feios? Será porque o Lula é um sapo gordo sem dedo, o Renan Calheiros tem cara de madeira de mordomo assassino, o Serra cara de vampiro medieval, a Marina de ariranha desmamada precocemente, a Luciana Genro se parece com o Valderrama, será esse o mesquinho motivo pelo qual não nos interessamos pelas agitadíssimas vidas privadas de nossos políticos? Nossos políticos não deveriam ser desconhecidos do grande público já que são espetaculares.

Voltando aos célebres políticos, o Brasil elegeu além dos votadíssimos Tiririca e Wagner Montes outros brilhantes nomes como Romário e Bebeto, a dupla de ataque de 1994 e, demonstrando que nos últimos anos o futebol brasileiro começou a valorizar também o setor defensivo, elegemos Danrlei para fechar o gol; Marques também está presente para suprir a dupla de Parreira.

O que farão figuras como Romário e Tiririca no Congresso? Nem eles sabem e o segundo não cansa de repetir que não tem nem a mínima ideia de onde está se metendo. Falando nisso, impossível não destacar a participação da laranja biônica Weslian Roriz, mulher do governador cassado do Distrito Federal que buscava a reeleição, mas que foi impedido pela Lei da Ficha Limpa que, diga-se de passagem, o sistema jurídico nacional com seus profissionais com 15 salários por ano, dois meses de férias e falantes de latim está fazendo de tudo para derrubá-la, colocou a mulher no seu lugar ignorando que se trata de uma dona de casa semi analfabeta que possui o único atributo de não ruborizar de vergonha em suas participações em debates de televisão.

Falando em candidatos criminosos, sempre está Maluf que recebeu quase meio milhão de votos dos paulistas.

Santa Catarina, juntamente ao Rio Grande do Norte conseguiram eleger um candidato do DEM. Uma sigla que se não significa “demônios” deveria ser. O DEM é o partido responsável pela maioria da entrada de verdadeiros criminosos na esfera pública e ainda consegue eleger DOIS governadores.

ACM Neto, O Herdeiro, também foi eleito pelos baianos, bem como Garotinho, inventor da falcatrua de colocar a mulher laranja (nenhuma alusão às mulheres Melão, Melancia e Pêra) como engodo, atitude que lançou escola no Distrito Federal e até na Argentina e que acabou ganhando a bênção do povo carioca apesar de todos os seus crimes recentes.

Qual a solução? O mais lógico seria fazer o lógico, não eleger esse tipo de gente, mas nem sempre o mais lógico é a via mais fácil. Considerando isso, imposições legislativas deveriam existir. Se para ser médico necessitamos anos de estudo, o mesmo vale para ser engenheiro, por que para ser político não há qualquer pré-requisito? Atualmente até para ser técnico de futebol profissional exige-se um diploma, por que não adotar as mesmas regras para o mundo político? Por que não exigir um curso de gestão pública que acabaria eliminando grande parte dos oportunistas de plantão? Muitos podem dizer que haveria limitações baseadas no poder aquisitivo o que é um argumento válido, mas de solução fácil: curso gratuito com vagas ilimitadas para gestão pública. Ponto final. Todo mundo tem as mesmas chances, mas só quem tem as mínimas condições estaria apto. Assim sendo não sou contra os bons salários pagos aos políticos, mas estes devem ser profissionais capacitados para merecer tais quantias. Aliás, o exemplo já deveria ser dado pelos governos executivos que deveriam selecionar profissionais do ramo para cargos como ministros e secretários.

Todo esse assunto também poderia ser resumido com um clamor pela mais do que necessária reforma política que Lula não fez não sei por quê. Luciana Genro obteve 129 mil votos e não foi eleita enquanto que a grande votação de Manuela elegeu indiretamente um candidato com 100 mil votos a menos que Genro. Considerando o fisiologismo pornográfico de nossos partidos, essas regras só podem ser vistas como pré-históricas e absurdas bem como a divisão de senadores que não respeita a representatividade de cada estado que resulta em um senado crivado de gângsters do norte-nordeste do país.

Enquanto estamos longe da tão sonhada reforma política, temos que nos contentar e de certa forma tentar desfrutar das cenas que virão com Tiririca, Romário, Bebeto, Wagner Montes e, a melhor de todas, Weslian e seguir competindo com as celebridades por um pequeno pedaço de glória.

Falando no poder das celebridades, o livro mais vendido do mês no Brasil é a brilhante obra de Ana Maria Braga contando sobre os 10 anos do seu programa diário de televisão. Bomba atômica já!

sábado, 2 de outubro de 2010

As Ligas Mais Difíceis do Mundo

Através do meu ranquim de clubes resolvi acatar a sugestão de leitores e gente que acompanha o melhor ranquim do mundo e fiz uma lista das ligas mais disputadas do planeta.

Antes de lê-la aclaro: não estou dizendo que é uma lista de nível técnico, de forma nenhuma. É simplesmente uma lista que tenta mostrar quais são os campeonatos nacionais mais parelhos, disputados, difíceis.

A pontuação foi construída em cima de fatores como: desempenho da seleção nacional de cada país em copas do mundo; desempenho internacional dos clubes de cada país nas três competições continentais mais importantes do mundo; número de clubes que já conquistaram a competição nacional de seu respectivo país e importância de cada liga.

As 10 primeiras ligas são:

1. Argentina
2. Brasil
3. Itália
4. Alemanha
5. Inglaterra
6. Espanha
7. Uruguai
8. Holanda
9. Portugal
10. México

terça-feira, 14 de setembro de 2010

Champions League 2010/2011

Já com os grupos definidos, começará a maior competição europeia em nível de clubes nesse mês de setembro.

Aqui faço, como de costume, uma análise dos grandes clubes europeus que estarão participando.

1-Inter Milan (Itália): o atual campeão perdeu o seu grande mentor, o português Mourinho e começou a temporada com alguns tropeços que podem ser considerados normais considerando um princípio de novo trabalho. Sem reforços de peso, o time que ganhou tudo na temporada passada segue sendo forte candidato a chegar à final.

2-Lyon (França): o time francês mais vencedor da última década mais uma vez não investiu em reforços. Não deve realizar uma campanha superior a passada quando eliminou ao esquizofrênico Real Madrid. No entanto estão em um grupo muito acessível que devem vencê-lo.

3-Benfica (Portugal): depois de muitos anos sem ganhar o campeonato local, o clube mais popular da terrinha levantou o caneco ajudado principalmente por seus jogadores sul-americanos Aimar, Saviola e Cardozo. Apostando mais uma vez em argentinos, seu principal reforço foi Gaitán, jovem revelação do Boca Juniors. Começaram a temporada com muitos tropeços e acredito que não passarão da primeira fase.

4-Manchester U (Inglaterra): seguindo a linha de retração no mercado, o time de Ferguson não abriu a carteira e apenas contratou o jovem atacante mexicano Hernandez. Scholes vem sendo o grande destaque do time e Rooney ainda não conseguiu superar seus dramas pessoais e não vem sendo nem sombra do monstro que foi na temporada passada até a fatídica participação na Copa do Mundo. No entanto, o tempo e a experiência de Sir Ferguson deverão ajustar o time e a cabeça de Rooney e serão, como sempre, fortes candidatos.

5-Barcelona (Espanha): neste que é um dos melhores times de futebol de todos os tempos, poucas peças serão mudadas. Saiu o mercenário Ibra que jamais esteve confortável no time catalão e chegou David Villa, um dos grandes nomes da Copa juntamente a Mascherano que substituirá a Yaya Touré. Faltou mais uma vez a concretização do sonho de trazer um de seus filhos prodígios de volta a casa, pois Fabregas, mais uma vez, postergou sua iminente ida ao time de seus amores que o viu nascer para o futebol. Com essas duas mudanças e confiando mais uma vez nas genialidades de Busquets, Xavi, Iniesta e Messi, o Barcelona é o meu grande favorito a ser campeão.

6-Bayern Münich (Alemanha): os bávaros mais uma vez chegam à maior competição do Velho Mundo como grandes forças do continente. O maior clube do mundo conta com grandes individualidades, muitas delas ainda mais confiantes e valorizadas depois de grandes performances na Copa e também com um técnico que tem experiência. É um dos times com mais craques no elenco se considerarmos nomes como Lahm, Schweinsteiger, Ribery, Robben e Müller. Forte candidato.

7-Marseille (França): depois de ter gastado o que tinha e o que não tinha em temporadas passadas, o maior clube francês conseguiu o objetivo de voltar a levantar a taça de campeão local. Não chegaram reforços, mas o grupo é forte e tem o respaldo da recente conquista. Além disso, caiu em um grupo acessível onde deverá terminar com a segunda vaga.

8-AC Milan (Itália): o clube de Berlusconi demorou para ganhar as notícias, mas, no último dia da janela de transferências anunciou a bombástica contratação de Ibrahimovic, ex-ídolo do maior rival milanista, a Inter Milan. O AC Milan começou bem no Calcio e aposta em um quarteto ofensivo com o sueco mais Pato, Robinho e Ronaldinho e também confia em um experiente colombiano que finalmente terá uma chance em um gigante europeu, Yepes. O ponto negativo para os rossoneri é o grupo complicadíssimo que conta com outras duas potências do futebol mundial, o Real Madrid e o Ajax. Mesmo assim, deve classificar.

9-Real Madrid (Espanha): a bonança financeira do time da capital espanhola sempre mexe com o mercado e torna o elenco merengue um dos mais visados em qualquer competição. Dessa vez chegaram Di Maria, Khedira, Ricardo Carvalho e Özil, nada se comparado às contratações da temporada passada. No entanto, o que gerou mais comoção no Santiago Bernabeu foi a chegada de Mourinho, o homem campeão de tudo e que promete colocar o maior clube do país de volta ao seu lugar. A Champions League é a competição mais importante, mas desbancar o grande rival Barcelona talvez seja um objetivo ainda maior ao time de Florentino Pérez.

10-Ajax (Holanda): o maior clube holandês volta, depois de cinco anos, à fase de grupos da maior competição europeia. No confronto eliminatório contra o Dinamo de Kiev mostrou ser um time apenas médio e que não deve ir muito longe na competição ainda mais que caiu em um grupo complicadíssimo. Sua grande arma é o atacante uruguaio Suárez que vive um momento espetacular e também tem a segurança de Stekelemberg, fundamental na conquista da vaga contra os ucranianos.

11-Arsenal (Inglaterra): o time de Arséne Wenger sempre gera grandes expectativas, pois é, depois do Barcelona, o time que melhor trata a bola no mundo. A filosofia do time londrino segue a mesma, apostando em jogadores jovens como Walcott que começou a temporada de maneira brilhante até lesionar-se mais uma vez. O novo atacante Chamack também vem dando boa resposta e o início de temporada faz com que seus torcedores se iludam como uma nova grande campanha europeia.

12-Partizan Belgrado (Sérvia): sei absolutamente nada sobre o atual time do Partizan.

Meus palpites quanto aos classificados da primeira fase em cada grupo:

Grupo A: Inter Milan e Tottenham;
Grupo B: Lyon e Schalke;
Grupo C: Manchester U e Valencia;
Grupo D: Barcelona e Rubin Kazan;
Grupo E: Bayern Münich e Roma;
Grupo F: Chelsea e Marseille;
Grupo G: AC Milan e Real Madrid;
Grupo H: Arsenal e Shakhtar Donetsk.

sexta-feira, 10 de setembro de 2010

Tempos Aqueles

O meu único colunista tem seus momentos de nostalgia e cafonice. Leio apenas um colunista. Todos os dias. Juremir Machado da Silva é o escolhido por sua ironia, sarcasmo e inteligência. E Juremir de vez em quando cai em uma espécie de depressão nostálgica. Diz que, escutando Roberto Carlos com suas “emoções” relembra dos tempos de sua Palomas, pequena cidade localizada perto de Santana do Livramento. É cafona? É; no entanto, há momentos em que somos todos dominados por essa nostalgia, essa saudade do passado.

Pois eu hoje estou nostálgico. Faz frio úmido e chove sem parar em Porto Alegre. Para pessoas normais, um clima perto do insuportável; no entanto, é o meu preferido.

Sinto mais falta de Ipanema do que Porto Alegre; sinto mais falta da Ipanema de minha época de criança do que a Ipanema atual e de Porto Alegre.

Na minha infância um dia assim, de frio intenso e chuva, seria para reunir-se com os amigos em casa e jogar International Super Star Soccer durante toda a tarde.

Qualquer ameaça de diminuição da chuva era motivo para uma batida de bola na rua. No
entanto havia o nosso amigo Rique que sempre - parecia que esperava esses dias - nos convidava para jogar bola em seu campinho ao lado de casa.

Três para cada lado, barro e muita água acabavam com um par de tênis e uma prenda de roupas inteira. A situação era tão caótica que tentávamos dizer não, mas não adiantava, o poder de persuasão do amigo e a paixão pelo futebol eram tão grandes que lá acabávamos a noite, não importando se já havíamos tomado banho e os tênis eram novos. Lá estaríamos. Felizes.

Ipanema era como uma pequena cidade do interior dentro de uma grande cidade. Nossa Passárgada. Os mais antigos, quando tinham que ir ao centro ou qualquer outra zona da cidade diziam que iam à “cidade”. Ipanema não fazia parte da cidade. Ipanema tinha e ainda tem estabelecimentos que não fazem parte da atual sociedade. O mercado do Alberto que não tem nome era um exemplo. Lá íamos e não pagávamos, anotávamos em um caderno e, ao final do mês, nossos pais pagavam. Muitos picolés e refrigerantes durante o verão, muitos chocolates e bombons durante o frio do Pampa.

O bar do Turíbio também é outro elemento bizarro do bairro. Aos fins de semana havia o famoso churrasco do velho Turíbio. Ia quem queria, comia-se muito e bem e, ao final, quem quisesse pagar, pagava. O almoço do dia era feito pela velha esposa do velho Turíbio, mais conhecida como “Robocop” por seu caminhar robótico causado pelo reumatismo. Não havia cardápio nem opções. Comia-se o que tinha na casa, o que a família comeu.

Nossos dias mantinham surpresas. Nunca sabíamos o que iríamos fazer. Claro, a rotina estava de certa forma presente. Durante a semana, após o colégio, era questão de minutos para que chegasse a minha casa o meu irmão que não morava comigo. De dentro do meu quarto o via chegar. O portão não era trancado, assim que eu não precisava nem me levantar para abrir a porta. Chegava ainda de uniforme do colégio catando tatus do seu adunco nariz. Entrava, nem dava oi. Pegava um controle e jogávamos um pouco de International até a comida baixar ou então olhávamos os gols da rodada.

A única coisa que sempre tinha sem falta e não importando o clima era futebol. Ao final da tarde, estávamos sempre famintos como dragas. Nada como um convite do meu pai para irmos comer no Número 1 Lanches, uma lancheria que servia uma imensa a la minuta que depois se transformou em discoteca de marginais e hoje é uma loja que vende colchões.

Nos fins de semana pelo menos tentava dormir até tarde. Como não havia aula, a chegada de meu irmão era sentida por volta das 8h. Soava a batida da bola na parede exterior de meu quarto. Ele simplesmente não respeitava. Não se alterava ao ponto de tocar a campainha: Ficava lá, no pátio, batendo bola e esperando seus companheiros mais preguiçosos levantarem para um dia integral de diversão.

A sucessão de disputas de International não pode ser ignorada em um texto sobre a infância. Acho difícil que, no mundo, alguém tenha jogado mais e melhor do que nós dois esse jogo. E não era apenas um jogo de vídeo-gueime, eram verdadeiros embates.

Havia os clássicos como meu pai contra Ângelo, talvez o maior entre todos os clássicos. Se o segundo marcava um gol muito cedo, o primeiro resetava o jogo sem nem olhar para o adversário que não reclamava. Cada um com suas peculiaridades. Meu pai com times europeus sem jogadores negros e que prezavam a organização tática e a defesa; Ângelo sempre louvando as sub-raças ia de México ou algum time africano; eu, sempre demente e organizado, ia revezando e só trocava de time após uma derrota; anotava com que time ganhava mais. Adorava jogar com a Coreia do Sul porque o time era bom e porque meu maior rival detestava e segue detestando raças orientais.

O nosso mundo era basicamente quatro quadras. Não tínhamos muito interesse em saber o que passava fora de nosso território, território esse que tinha inimigos, claro. Poucas vezes saíamos dessas fronteiras. Comprar botões na Ipanemy exigia um deslocamento maior, bem como a interminável viagem até a AABB que era uma espécie de outro continente. Felizmente havia as bicicletas, nosso meio de transporte por vários anos.

Outro fator marcante dessa época era a ausência de dinheiro, papel moeda. Simplesmente não nos interessava. De vez em quando comprávamos alguns botões como citei anteriormente, mas dinheiro nunca foi tema em nossa infância. Um ou dois reais eram suficientes para subornar os testas-de-ferro da SABI para que nos deixassem jogar à luz de boate e deu, não era mais necessário.

A organização populacional masculina do bairro era simples. Dentro do meu terreno, meu avô, meu pai, Galo e eu. Duas quadras à direita, meus outros três irmãos que não moravam comigo. Uma quadra na diagonal, a casa do Bruno, outro ponto de encontro e centro de diversões comandado pelo carisma e o sempre inalterável bom humor da tia Loiva, a matriarca da casa e das pessoas mais queridas por todos na nossa rica infância.

Meu vô era talvez o maior personagem do bairro. Um velho demente, fumante inveterado e tomador de cerca de dois litros de leite diários. Tomava cerca de 40 cafezinhos por dia e, de café da manhã, ia de chuleta com ovo frito acompanhado de uma paint de leite cru. Brincalhão, o que mais gostava na vida era ver a gurizada atormentando na casa. Protegia o mais fraco e adorava ao de pior caráter. Muitas vezes, devido à presença de seus Ray-Ban de lentes verdes, não sabíamos se ele estava acordado ou dormindo quando sentado no avarandado ou nos canteiros. Nos almoços de domingo, era o dono da festa e o rei da brincadeira de servir bebida a todos e deixar Ângelo de copo semi-vazio. O pior é que a brincadeira milenar jamais perdeu a graça. Somente o meu velho que, implicante com o Hector, resmungava para ele mesmo: “trouxa...”

Devido ao clima receptivo e amistoso de minha casa, por lá passávamos a maior parte do tempo. Na casa de meus outros irmãos reinava mais a disciplina, algo que jamais suportamos e que nos fazia comportar um pouco mais. No verão, passávamos por cima da disciplina e desfrutávamos da piscina pelo menos bem como de alguns churrascos ao meio-dia de domingo vendo jogos do Campeonato Italiano sendo narrados pelo Silvio Luiz na eterna televisão bege do Tergolina.

Na minha casa também havia temporada de piscina com direito a concurso de pontas. O juiz, sempre ele, Hector, de Ray-Ban, cigarro em punho, pele de jacaré torrada pelo sol e que chegava ao ponto de cochilar até dentro d´água. O velho Heitor aproveitava sua posição privilegiada de dono da lei e favorecia clamorosamente a Galo, o menor de todos. Dez com louvor era a nota mais recebida pelo esquálido Garni Zé.

Muitas pessoas nos remetem à infância, mas também alguns aromas e lugares me fazem pensar nos tempos já distantes. O cheiro de goiaba é algo que de imediato provoca no meu cérebro uma reação de nostalgia. Todos os verões era o mesmo cheiro forte de goiaba podre no chão seco com um sol implacável que catalisava o alcance de seu aroma. O curioso era que, a exceção do excêntrico Pablo e desde que minha avó parou de fazer doces e chimias de goiaba, ninguém mais as consumia. Tudo acabava podre no chão sendo desfrutado apenas pelos pássaros de gostos alimentícios ecléticos durante o dia e pelas terríveis gangues de gambás noturnos.

Outras frutas menos olorosas também tinham sua época. As uvas pretas que na verdade eram roxas e as rosas que de fato eram rosa quase ruíam as estruturas de nossa parreira. Comíamos uvas de diferentes formas, desde os cachos refrescados por um período na geladeira, até cucas e suco, muito suco. Dificilmente um estômago humano aguentaria a quantidade de litros que consumíamos durante os calorosos primeiros meses do ano. O calor escaldante era convidativo para um cacho de uvas frescas na beira da piscina.

Outras frutas de sucesso e de presença constante eram os maracujás e os abacates. Os primeiros coloriam de amarelo dois ou três pés e também, assim como as uvas, eram fonte de inesgotáveis toneladas de litros de suco. Já os abacates eram utilizados pela minha vó para pelo menos tentar diminuir o ímpeto assassino de fome dos jovens em crescimento. Talvez por temer o desempenho animalesco de Ângelo durante o café da noite, nada melhor do que uma batida reforçada de abacate durante a tarde. Duas paints para cada um era como ter comido dois quilos de carne. Infelizmente para a minha vó, assim como desenvolvíamos com rapidez também digeríamos com eficiência e Ângelo não terminava um café da noite sem antes ter comido pelo menos três cassetinhos e meio quilo de queijo. O ritmo frenético em que ia ao banheiro renovava constantemente sua fome voraz.

Muito dessa fome devastadora e ânsia por comer que marcou nossa infância era devido à intensa atividade física, leia-se “futebol”. O campinho no pátio da minha casa com uma goleira de árvores sem travessão e outra feita pelo meu pai sob nossa apática supervisão somados a goleira conformada por dois postes de concreto que sustentavam a parreira, eram o nosso hábitat mais natural. Com luz natural ou com luz artificial e com voos rasantes de morcegos injuriados com o intenso e infindável movimento em seus territórios jogávamos o dia inteiro, até a exaustão que só foi chegar com o fim da infância.

Se não era na minha casa era na SABI, o nosso eterno templo. Éramos obrigados a subornar os pobres funcionários, muitas vezes chegávamos ao ponto de interromper suas sestas e ainda nos parecia absurdo quando preferiam nos ignorar e seguir com seus sonos do que abrir as portas do nosso paraíso. No piso de parquê da SABI jogávamos quase todos os dias a exceção das segundas-feiras quando o clube não abria e, obviamente, essa regra nos indignava. Quando nossas humildes propinas não eram suficientes ou demasiadamente humildes, nos restava jogar sem luz confiando em nosso instinto.

A Sociedade dos Amigos do Balneário de Ipanema, fundada por meu bisavô na época em que Ipanema era um balneário, que o Guaíba era limpo e que donzelas aristocráticas como minha vó lá iam aos fins de semana vestindo vestidos veranicos brancos e chapéus também foi sede de alguns torneios memoráveis de futebol de salão, a maioria organizado por nós mesmos. Ganhávamos de todo mundo. Sempre. Mesmo quando o nosso maior atleta Rique abandonava a cancha para dar lugar a seres hediondos do bairro como Conrado - jovem desprovido de qualquer talento e que tinha um apelido que remetia aos piores dos dejetos humanos - assim mesmo seguíamos empilhando gols e brindando os mais de dois espectadores com bom futebol, ou melhor, bom futsal.

Esses campeonatos tiveram seus momentos históricos como o seu Dudi, famoso por sua estirpe disciplinadora sendo árbitro de alguns jogos. Meu pai também vestiu os trajes negros e aceitou a posição cuja principal qualidade é o desapego à própria mãe. Apitava o jogo com um copo na mão, lavado em suor e prejudicando sem disfarçar o bom desempenho de seu filho bastardo Ângelo. Falando em nossos pais, o velho Günther, cidadão germânico nascido em Frankfurt e radicado em Ipanema chegou ao ponto de discutir com o nosso adversário mais boçal, Bugio, o negro de pele branca que rugia a cada chute ao arco.

Apesar das dificuldades, a SABI sempre acabava cedendo à nossa tentação de jogar. No entanto havia um local idílico, místico eu diria, que era quase impossível de se lograr. A FUNSEG era um clube que possuía uma cancha de salão impecável e um campo de futebol sete espetacular que atrás abrigava um banhado que, dizia a lenda, até cobras e crocodilos albergava. Jogar lá era uma obsessão tão grande e incontrolável que chegávamos ao ponto de cometer o crime de invasão de propriedade privada. Simplesmente invadíamos e não satisfeitos ainda acendíamos as luzes do ginásio e lá jogávamos com um olho na bola e outro na porta esperando os capangas do clube acordar e irem atrás de nós de rotweiller em punho. Voltando ao banhado que hoje é parte de um novo centro comercial do bairro e possui concreto onde antes tinha místicas anacondas, nunca me esquecerei do dia em que estreava uma meia nova do Grêmio toda azul celeste da Penalty e fui o responsável por um mal disparo à meta. A bola caprichosamente passou entre os inúmeros buracos da grade e espatifou-se no banhado. Devido à lenda dos animais carnívoros que habitavam o lugar, não tirei os tênis e lá fui, atolar-me na lama para recuperar a redonda. Felizmente nesse dia nem as anacondas nem os crocodilos estavam em casa para amedrontar os barulhentos cidadãos que causavam rebuliço na área ribeirinha.

Na já citada Coelho Parreira havia também outro centro de futebol dos fins de semana ou férias que era a casa do Omp. Omp se chamava Leonardo e é mais conhecido por ser o cara que chorou quando teve sua pessoa e seu futebol denominado com o adjetivo “sinistro” em uma alusão a um comentarista de televisão da Bandeirantes. Omp era asqueroso. Foi meu colega na infância e é filho do Nobrinho, ex-comentarista esportivo que uma vez foi flagrado por nós em um restaurante do bairro que tinha um touro mecânico com outra mulher que não a sua esposa e consequentemente mãe de Omp e que está longe de ser menos asqueroso que sua prole única.

Omp era tão asqueroso que era a única pessoa à época que conseguia ser odiada por Ângelo. Ok, hoje Ângelo é um homem velho, depressivo e corroído pelas punições impostas por “El Barba”, mas naquela época ele jamais havia odiado alguém antes. Em um aniversário do dito cujo Ângelo o xingou durante um torneio de futsal e este revidou com uma agressão física. Consequência: foi expulso do campeonato que comemorava o seu PRÓPRIO aniversário. Resumo da ópera: Ângelo ARRUINOU a festa do coitado mesmo sendo jogador do MESMO time do brigão excluído.

Terminando a sessão de lugares em que jogávamos não posso não mencionar o campo caseiro do Maurício, um carioca asqueroso que vinha em suas férias e somente com ele em Porto tínhamos chances de pisar numa relva que mais parecia o gramado do velho Wembley, hoje destruído. Aliás, “Wembley” era o nome que demos ao espaço verde da rua Coelho Parreira, lugar de fundação do freguês de carteirinha Parreirense e fundado por um ex-jogador do nosso time expulso do “clube” por mim, que era, além de ala direito, presidente da instituição mais vencedora do bairro.

A nossa relação com o literalmente “dono do campinho” era de uma falsidade de dar inveja a muita mulher. Suportávamos todos os seus caprichos para manter a suposta amizade intocável e seguir jogando lá todos os verões quando ele cometia a loucura de sair do Rio de Janeiro e ir para Porto Alegre em pleno verão. Quando chegava a época das férias do gordinho, sempre perscrutávamos com mais afinco o terreno com o intuito de encontrar algum movimento humano.

Além do futebol tivemos também algumas experiências em outros esportes, mas nenhuma delas foi duradoura. Improvisamos uma cancha de tênis onde era a cancha de futebol de nossa casa. Piso de saibro natural contando também com adubo natural cedido pelos ilustres cachorros que passaram pela casa. A rede era um banco milenar de madeira.

Os jogos de tênis não duraram muito. Primeiro porque tínhamos pernas saudáveis e queríamos era jogar futebol e segundo porque chegou um ponto em que ninguém mais aguentava o estilo arrogante e asqueroso com que Ângelo desfilava levantando pó do nosso saibro. Assim como os confrontos de futebol, as partidas de tênis eram jogadas de dia e de noite e eram às vezes interrompidas pelas visitas através do portão de Heloísa que nos oferecia uma sopa de feijão com pão velho enquanto catava pinhas para a lareira com seu típico e eterno frenesi. Falando em Heloísa, sempre saliento que é das pessoas mais fantásticas que já conheci na minha vida e que foi uma das imensas personagens de minha infância e segue sendo parte de minha vida. Era alguém que jamais perdia o bom humor e a disposição não importando a situação em que se encontrava.

Além do tênis, tentamos também o futevôlei e esse foi um sucesso que durou um verão. Jogávamos no gramado inclinado em frente à janela do quarto de meus avôs. Os times sempre se repetiam: eu e Ângelo contra meu pai, Galo e Lãqui. Na arquibancada lá estava o eterno crocodilo fumante, torcendo pelo Galo e acusando meu pai que a essas alturas suava como um suíno de ser o responsável pelas derrotas do time de três integrantes. Era fisicamente impossível a prática desse esporte em terreno tão irregular, mas, outra vez, nos adaptamos perfeitamente às condições do ambiente e nos tornamos excelentes jogadores.

Como não poderia faltar, também havia os vilões do bairro. O principal deles foi um temível rotweiller cujo nome soviético gerava calafrios em todos e nunca soube se era uma homenagem ao escritor russo: Gorky. No entanto sei que a palavra “gorky” em russo significa “amargo”. Nada mais propício. O desgraçado cão tinha uma raiva imensurável por nossa alegria e expressava toda essa sua amargura destruindo qualquer bola que ousasse cair em seu terreno. As destruía com uma raiva assombrosa e com um ritual de tortura psicológica incluído. Grandes bolas da nossa infância tiveram as garras e dentes afiados do cachorro soviético como suas armas mortais.

Jamais esqueceremos a nossa japonesa Pelada que não era uma revista erótica do país do longínquo oriente senão uma bola de couro brilhosa trazida ao Pampa pelo elenco de um time nipônico amador. Chegamos a estudar a hipótese de mandar o rotweiller do bem para o terreno vizinho e acabar com a raça desse maldito sucessor de Stalin. Por pura ironia do destino, ou melhor, do passado, o nosso rotweiller do bem se chamava “Russo”. Ou seja, seria briga caseira e em briga de russo eu, pelo menos, não me meto.

Eu estaria sendo um ser humano preconceituoso se não citasse a Russo como um dos personagens do bairro que marcou nossa infância. Russo convivia com Dóbi que era uma espécie de seu oposto em gênero, número e grau. Russo era, antes de mais nada, um boa vida e “cadeleiro” nato. Durante o dia mantinha-se recostado. Se injuriado, rosnava. No entanto, quando a noite caía, se tornava uma verdadeira ameaça para todas as cadelas recatadas ou nem tanto do bairro. Fugia não importando o novo empecilho armado pelo velho Heitor. Saía de noite e somente reaparecia na manhã seguinte quando, ao sair de casa para ir ao colégio, lá estava ele sentado na frente do portão principal com cara de arrependido, não - literalmente com o rabo entre as pernas, pois este tinha o rabo podado e esperando a punição. Jamais em minha vida conheci um ser mais boêmio do que Russo que não deixava de dar suas escapadas uma noite sequer.

Ao seu lado Dóbi, um dos seres mais idiotas que já conheci. Por mais que o portão estivesse escancarado com um churrasco, gatos paraplégicos e cadelas no cio na frente deste, ele não saía. Preferia estar no pátio correndo atrás do próprio rabo, com uma pinha na boca e oferecendo uma surrada e empapada bola de tênis para o primeiro que aparecesse. Infelizmente a harmonia canina na casa acabou num dia em que Russo quase matou ao pobre Dóbi que se foi de casa tendo nitidamente perdoado o amigo com quem teve um dia de diferenças incompatíveis.

Quando o futebol nos dava trégua, também tínhamos algumas outras atividades. Fazíamos pega-pega de bicicleta o que é, segundo o outro, um dos esportes mais perigosos de todos os tempos, comparado ao futebol medieval e às batalhas de gladiadores com tigres. Além das bicicletas contemporâneas tínhamos uma relíquia. Uma Monarc 1976 com freio no pedal que pertenceu ao meu avô.
O que prejudicava a maioria das nossas brincadeiras ou o próprio futebol era as constantes e patéticas brigas entre os pequenos. Lãqui e Galo não passavam muito tempo em cessar-fogo. Qualquer diferença tirava o pavio curto Lãqui do sério e a vítima era quase sempre o menor do grupo. Inesquecível a briga que durou cerca de 10 segundos e que foi prematuramente findada devido à percepção do ridículo da situação pelos dois ao mesmo tempo quando se viram um agarrando a orelha do outro. Os métodos utilizados foram tão surreais que acabou com qualquer chance de peleia.

Ângelo e eu também tínhamos o saudável hábito de arruinar festas de terceiros. Ângelo entrou por um buraco na cerca da casa do Vinícius e roubou doces da festa da Carol. Foi descoberto pela diabólica avó da aniversariante, mas encoberto pelo brincalhão Vinny que, por sua vez, detestava a sogra. Falando em Vinny, difícil encontrar um personagem mais fantástico do que este. Jamais conheci um ser humano com tão pouca vergonha de tudo. Jamais esquecerei a cena dele se escondendo atrás das árvores de minha casa para que a sogra que estava de visita não o visse. Um de seus atos terroristas favoritos era massacrar e envergonhar o pobre Galinho. Quando nos buscava no colégio colocava meio corpo para fora do carro e gritava sem parar “Tini, Tini” e fazia gestos de masturbação masculina para desespero do tímido Tini que em questão de milésimos via sua pele alpina ruborizar.

Se eu fosse escrever todas as histórias de nossa infância aqui, iria morrer em frente ao computador. Volta e meia imagens felizes me cruzam a memória como nossas idas aos jogos do glorioso Ipanema com oito pessoas dentro do saudoso Kadet branco de Heloísa. Lembro de Ângelo e eu contrariando as recomendações médicas indo jogar bola sob o sol escaldante do terreno de Belém do Bruno. O resultado foi eu perguntando ao meu saudoso irmão se estava vendo tudo azul e recebendo uma resposta afirmativa. Acabamos os dois tontos, a ponto de desmaiar sentados à beira do campo e gozando da ínfima proteção de uma imiscuída sombra que contrariava a claridade africana do espaço. Para completar, o almoço que nos deveria restaurar para seguir na batalha sob sol de 50 graus era o temível arroz de cachorro do mais temível ainda, Sérgio, o Terrível.

Lembro também de acusações graves feitas pela oposição contra nós. A irmã do Peri nos jurando sobre a bíblia que a havíamos ameaçado com canivetes. Lembro também do inconseqüente roubo da torta de aniversário de minha prima Nanda realizado pelo Pingo. Terminamos todos correndo e nos escondendo no mato quando minha vó descobriu a tentativa de furto e a possível ruína da festa do dia seguinte.
Outro dia especial foi o da final do Mundial Interclubes entre o Tricolor e o Ajax. A expectativa de todo o ano esperando, a noite anterior sem dormir, todos cedo na minha casa, a “de baixo”, não a “de cima” que nessa época era dos meus avôs, meu pai servindo café da manhã para os presentes e, depois da derrota nos pênaltis, os estrondos dos foguetes tirados por André o mesmo que expulsei do elenco do Ipanema e os gritos dementes de Pablo.

As vizinhas gostosas e arredias que se mudaram para a casa que antes era do Malé em frente à casa da Heloísa, as corridas de carros de dar corda, as batalhas de futebol de botão...tudo vai se apagando a medida em que passa o tempo. Nada mais pode trazer aqueles dias de volta e a única ação que podemos tomar é tentar relembrá-los o mínimo possível e ignorando o que o futuro guardou para seus personagens que hoje estão mortos, paraplégicos, depressivos, dementes, alcoólicos, exilados, desaparecidos, internados, doentes, ausentes...

domingo, 11 de julho de 2010

Resumo da Copa

E mais uma Copa do Mundo se acaba. Que evento tão espetacular é a Copa do Mundo. É uma competição tão incrível que chega ao ponto de humanizar personalidades que pareciam ter sucumbido à sua posição de celebridades. Jogadores consagrados e donos de fortunas choram como crianças após uma derrota ou após um título.

Seus familiares estão nas tribunas e alguns não se contêm e distribuem sorrisos e beijos em suas direções como Maradona com suas filhas e alguns jogadores como Sergio Ramos e Fabregas na final com suas famílias.

Há reis, rainhas, atores, Mick Jagger, todos lá, sentados como qualquer um desfrutando do maior evento da Terra.

Essa Copa deixou algumas dúvidas quanto à realização de eventos dessa importância em países sem estrutura necessária. A FIFA tentou disfarçar, mas houve muitos problemas como na área de transporte, por exemplo, com muita gente não conseguindo chegar a tempo aos locais dos jogos; também houve assaltos, roubos e muitos, muitíssimos espaços vazios nos estádios, em alguns casos chegava a ser constrangedor como na partida entre Paraguai e Eslováquia. Mas até em semifinais esteve presente esse problema. No jogo entre Holanda e Uruguai podiam-se ver espaços não ocupados.

No entanto é bacana uma Copa em um lugar diferente. Sempre defendi que copas do mundo deveriam ser exclusivamente organizadas no continente europeu devido à sua infra-estrutura e tradição no esporte. Países estruturados fora da Europa como Estados Unidos, Japão ou Coreia do Sul, têm problemas diferentes como populações não sabendo quantos jogadores jogam ou então simplesmente falta de clima de Copa.

A primeira fase foi, tecnicamente, quase que insuportável, mas já era esperado. As
primeiras fases contam com times fracos e as seleções fortes jogam com medo de um tropeço que lhes pode abreviar a participação no Mundial. No entanto, era evidente que o nível, a partir das oitavas, iria subir consideravelmente e acabamos vendo uma boa Copa.

Não houve um grande destaque individual, mas muitos jogadores se destacaram e muitos times levaram muitos jovens para a competição o que é sempre saudável. Fracassos retumbantes não faltaram. O maior deles foi o da seleção francesa que foi um tremendo festival de absurdos. A Itália, atual campeão, também fez feio e abandonou sem ganhar sequer um jogo. No entanto considero a Inglaterra a maior decepção, pois foi ao Mundial com pinta de favorita e acabou sendo goleada por 4x1 pela Alemanha e seus principais jogadores não renderam o esperado.

Outro grande fracasso, o desempenho dos africanos, todos, à exceção de Gana, eliminados na primeira fase, incluindo-se nesse nefasto grupo o país organizador.

Tivemos, então, detentor do título, último vice e país-sede eliminados na primeira instância da competição.

O renascimento do Uruguai de volta aos primeiros lugares foi extremamente interessante. Inclusive teve um de seus jogadores escolhido como o melhor da competição, Diego Forlán.

A competição também puniu a mesquinhez de alguns times como Suíça e Grécia, eliminados, FELIZMENTE, na primeira fase. Houve um predomínio dos ofensivos contra os defensivos considerando que os três primeiros são times que sempre buscaram o gol.

Houve também quem exagerou na ofensividade e acabou caindo fora de maneira constrangedora, como foi o caso argentino. O melhor do mundo, Messi, não apareceu nas instâncias definitivas e acabou abandonando a África de maneira discreta e sem gols, assim como seus companheiros de artilharia Rooney e Milito que pouco jogou.

Klose chegou perto da marca histórica, mas perdeu alguns gols que não poderia perder contra a Austrália, não começou um jogo e sentiu dores nas costas que o deixaram de fora da decisão do terceiro lugar.

A Alemanha bateu o recorde de jogos disputados em copas do mundo.

Também tivemos poucas definições em cobranças de pênalti, somente duas.

Outro fato curioso foi quem a Espanha passou por oitavas, quartas, semi e final somente com vitórias pela mínima diferença e sem tomar sequer um gol.Possivelmente é o campeão com o menor número de gols marcados na histórias das copas.

Tivemos dois erros cruciais de arbitragem nas oitavas, o gol não dado à Lampard contra a Alemanha e o gol em completo impedimento de Tévez contra o México. Pela primeira vez a FIFA ameaça discutir o assunto com mais seriedade. Até o lance de Suárez contra Gana foi visto como motivo para a FIFA revisar suas centenárias regras. Sou contra. Querem deixar o futebol uma ciência exata. É entendível o argumento de que o futebol é um negócio e que muitos perdem muita coisa por erros.

Mas é um esporte. Um jogo. Tem que seguir tendo seu aspecto humano.

Classificação final da Copa:

1. Espanha
2. Holanda
3. Alemanha
4. Uruguai
5. Argentina
6. Brasil
7. Gana
8. Paraguai
9. Japão
10. Chile
11. Portugal
12. Estados Unidos
13. Inglaterra
14. México
15. Coreia do Sul
16. Eslováquia
17. Costa do Marfim
18. Eslovênia
19. Suíça
20. África do Sul
21. Austrália
22. Nova Zelândia
23. Sérvia
24. Dinamarca
25. Grécia
26. Itália
27. Nigéria
28. Argélia
29. França
30. Honduras
31. Camarões
32. Coreia do Norte

Aqui segue minha seleção da Copa no estilo 4-4-2:

1. Stekelenburg (Holanda)

2. Sergio Ramos (Espanha)
3. Friedrich (Alemanha)
4. Piqué (Espanha)
6. Capdevilla (Espanha)

5. Xabi Alonso (Espanha)
8. Xavi (Espanha)
10. Iniesta (Espanha)
11. Müller (Alemanha)

7. Forlán (Uruguai)
9. Villa (Espanha)

Bola de ouro: Forlán (Uruguai);
Bola de prata: Xavi (Espanha);
Bola de bronze: Müller (Alemanha);
Revelação: Müller (Alemanha);

Menções honrosas: Salcido (México), Suárez (Uruguai), Pérez (Uruguai), Johnson (Inglaterra), Khedira (Alemanha), Schweinsteiger (Alemanha), Özil (Alemanha), Gyan (Gana), Mathijsen (Holanda), Sneijder (Holanda), Lúcio (Brasil), Juan (Brasil) e Casillas (Espanha);

Decepções: Di Maria (Argentina), Gerrard (Inglaterra), Lampard (Inglaterra), Rooney (Inglaterra), Van Persie (Holanda), Cristiano Ronaldo (Portugal) e Torres (Espanha).

Vitória do Futebol

Espanha 1x0 Holanda: quem torcia por uma final entre sul-americanos a teve. Em um jogo com cara e clima de Libertadores, Holanda e Espanha brindaram o mundo com um excelente e apaixonante espetáculo.

Um grandíssimo jogo, com emoções até o final, inúmeras chances de gols, entradas ríspidas, enfim, uma final com todos os elementos de final sul-americana.

O início do jogo deu a impressão de que uma das minhas previsões poderia acontecer que era uma vitória com certa facilidade por parte da Espanha. A Holanda praticamente não tocou na bola durante os primeiros minutos do jogo e via a Espanha se aproximar de seu primeiro gol.

Stekelenburg, o melhor goleiro da Copa, salvou de maneira impressionante uma cabeçada fantástica de Sergio Ramos. Este, diga-se de passagem, foi o melhor jogador do primeiro tempo jogando como quase um ponteiro direito e criando várias oportunidades de gol. Uma delas faltou o cacoete de atacante quando entrou a dribles pela direita e tentou um busca-pé que acabou sendo rechaçado por Heitinga em lance que pedia a sua conclusão ao gol.

O meio de campo espanhol asfixiava Sneijder e a Holanda se via em uma situação de completa impotência. Robben não tinha contato com a bola e Kuyt era obrigado a jogar quase de volante para tentar conter pelo menos em parte o poderio do meio ibérico.

O gol parecia ser questão de tempo. Em um dos tantos lances ríspidos do jogo Capdevilla deve ser atendido pelos médicos, o jogo para por alguns minutos e parece que esfriou o time de Del Bosque. Quando o jogo recomeça, há uma nova situação em campo com uma Holanda que avança sua marcação, povoa o meio de campo, adianta sua defesa que deixa Villa quatro vezes em impedimento e, com essa pressão, equilibra o jogo. Xavi e Iniesta, os motores e cérebros da Espanha sentem dificuldades em encontrar espaços e o jogo ganha a cara que a Holanda queria. Meio de campo congestionado e espaços para os contra-ataques com a velocidade impressionante de Robben.

Há equilíbrio em campo, mas as chances mais claras passam a ser da Holanda, mesmo tendo menos posse de bola. A Holanda também passa a fazer uso de uma arma que Dunga usou com a seleção brasileira que é a sucessão de faltas “técnicas”. Sem violência, rodízio de faltas sempre evitando os cartões amarelos que acabam enervando e de certa forma parando um pouco a constância ofensiva do adversário. Uma das faltas deveria ter sido punida com cartão vermelho direto que foi a voadora de De Jong em Xabi Alonso. Um lance de artes marciais que não foi punido como deveria.

No segundo tempo começou a aparecer a estrela de Casillas, o melhor em campo. Casillas começou o Mundial demonstrando certa desconfiança, mas, no jogo contra o Paraguai e especialmente hoje, mostrou que segue sendo um dos melhores em sua posição no mundo. E apareceu pela primeira vez de forma magnífica em um mano a mano com nada mais nada menos do que Robben que recebeu passe brilhante de Sneijder e acabou não conseguindo concluir com sucesso. Tinha duas opções: driblar Casillas para a direita ou chutar por cima. Tentou por baixo e o goleiro do Real Madrid defendeu com a perna.

Do outro lado a Espanha também criava algumas chances principalmente provenientes de bolas paradas. Villa quase marcou em rebote da defesa e que acabou sendo salvo por Van der Wiel de forma espetacular.

Também aos 70 minutos, em outra cabeçada livre de marcação depois de uma cobrança de escanteio, Sergio Ramos colocou por sobre o arco holandês no que foi uma das mais claras chances de gol do jogo.

Outro lance desperdiçado pela Espanha foi devido ao preciosismo de Iniesta, algo que prejudicou todo o time espanhol durante essa Copa. Após excelente manobra e giro em cima de Heitinga, demorou em concluir e foi desarmado por Sneijder que estava marcando na pequena área e que representa um pouco o espírito de luta e de coletividade desse time holandês.

Já no final do jogo, após passe brilhante de Iniesta para Fabregas, esse recebeu livre frente a uma defesa extasiada e acabou tendo seu gol impedido por excelente saída mais uma vez de Stekelenburg.

A prorrogação começou dando uma ideia clara de que a Holanda queria os pênaltis, pois já não aguentava mais enquanto que a Espanha, fazendo jus ao seu estilo, buscava o gol de todas as formas. No entanto a primeira chance clara foi de Mathijsen para a Holanda após outra cobrança de escanteio. A zaga falhou e o zagueiro holandês, um dos melhores da competição, cabeceou para fora.

Aos 98 minutos Iniesta mais uma vez demorou muito para concluir a jogada e deu tempo para que a marcação de Van Bronckhorst chegasse.

A ideia era que havia espaços na defesa laranja, mas faltava esse jogador com a rapidez e o poder de conclusão para matar o jogo ainda mais se consideramos que Villa havia sido substituído por Navas que é jogador de flanco. Talvez Torres, mesmo considerando sua lesão e seu consequente fraco desempenho, poderia ser uma opção, mas entrou tarde e pouca chance teve.

O jogo foi tão bom que jamais deu a impressão de que a decisão por pênaltis era algo seguro. Sempre houve clima e cheiro de gol, nunca as possibilidades de o jogo ser decidido com bola rolando foram aniquiladas e aí apareceu o gênio Iniesta, com sua aparência de analista de sistemas ou como disse Menotti, cara de caixa de banco. O fato é que, após excelente passe de Fabregas recebeu no bico da pequena área, esperou o pique da bola e definiu com brilhantismo sem chances para o gigante goleiro holandês. Golaço.

O gol de Iniesta e o título da Espanha abriram um leque para inúmeras questões de discussão. Para mim foi antes de tudo, a vitória do favorito, do melhor, e do time que melhor joga futebol no mundo. Um time que jamais renuncia ao seu estilo clássico de jogo, que gosta da bola, que troca passes que tem paciência, que tem técnica que ama o jogo em si. Faltou apenas uma coisa para a Espanha nessa Copa que foi o poder de definição e muito disso é culpa da lesão de Torres, seu matador. Mas ganhou o melhor.

Também essa vitória pode ser vista como uma vingança do Barcelona contra um anti-futebol. O Barcelona perdeu a final da Champions League para uma Inter Milan que jogou com 11 jogadores defendendo; depois a Espanha começa sua participação na Copa perdendo para a Suíça que jogava com seus 11 jogadores dentro da pequena área. Assim sendo, foi a redenção e a confirmação de que o melhor futebol também pode ser competitivo e ganhar títulos.

Evidentemente que a Holanda não é um time defensivo como foi a Inter Milan no segundo jogo da final da Champions. No entanto apresenta aspectos de anti-jogo como o excesso de faltas, provocações, catimba, tentativas de dissuadir a arbitragem e, soma-se a isso, um louvável controle emocional que evita que seus jogadores, quase todos tinham amarelo, fossem expulsos.

Não sou contra o uso dessas artimanhas, mas é bonito ver ganhar um time que joga
futebol dessa forma.

Em qualquer jogo que há essa carga emocional e esse clima de guerra dentro das quatro linhas, a imprensa sempre critica a arbitragem. Isso acontece no Brasil e acontece aqui também. A arbitragem de Webb foi impecável. Seu único equívoco foi a não expulsão de De Jong, no mais, não cometeu erros que poderiam ter influenciado o resultado do jogo. Deu cartões quando deveria dar e, para mim, administrou o jogo com excelência, sem muito papo, com seriedade e bom trato para com os jogadores.

Minha única dúvida é justamente no lance crucial do jogo. Acho que os holandeses protestaram por impedimento quando Iniesta recebeu o passe e o mesmo pensam todos os jornalistas aqui e, claro, ficou evidente que não estava adiantado. No entanto, quando a bola é lançada pela primeira vez na área e o zagueiro tira de voleio, aí acho que alguém está adiantado e se foi Iniesta poder ser considerado que usufruiu de sua posição previamente irregular. Não sei. Ainda não consegui ver o vídeo de novo.

Terminando, critico a todos aqueles que facilmente foram manipulados a pensar que a Espanha seria um fracasso após perder de maneira injusta para a Suíça na estreia. Apenas eu e o um guri de 13 anos daqui sempre acreditamos na Espanha rumo ao título apesar desse tropeço.

Antes de começar a análise individual dos jogadores, excelente o comentário do narrador do jogo do canal colombiano. Disse ele que essa poderia ser a segunda final decidida nos pênaltis da história depois de Estados Unidos 1994. O incompetente esqueceu-se de outra, que não foi nos anos 30 senão a última edição na Alemanha em 2006. Meu Deus.

Análise individual:

ESPANHA

Casillas: brilhante. Duas defesas fantásticas e segurança durante os 120 minutos. 10

Sergio Ramos: o melhor homem em campo depois de Casillas, foi o nome do primeiro tempo como atacante, mas também foi impecável defensivamente. 10

Piqué: algumas desatenções em bolas aéreas, mas nada que arriscasse a manutenção do zero no placar. 7

Puyol: perdeu uma bola na velocidade para Robben que acabou nas mãos de Casillas. Quase marcou outro gol de cabeça. 7

Capdevilla: com sua sobriedade de sempre, sobe ao ataque quando pode, sem pressa e exerce de maneira impecável seu trabalho defensivo. 7

Xabi Alonso: um leão no meio de campo, é quem faz a cobertura dos gênios. 7

Xavi: devido ao combate imposto pelos holandeses em seu território não jogou como gostaria. Mesmo assim, foi o jogador importante de sempre. 6,5

Busquets: junto com Alonso é quem faz o trabalho menos límpido no meio de campo espanhol. Em alguns momentos do primeiro tempo parecia desatendo, mas foi preciso como o foi em todo a campanha. 7

Iniesta: demasiado preciosismo em jogadas que poderiam ter definido o jogo mais cedo. Sofreu com o excesso de faltas e com a forte marcação holandesa, mas encerrou o torneio com um golaço em uma bela definição. 7,5

Pedro: participou muito pouco do jogo e sentiu a pressão exercida pela defesa adversária e pelos volantes de contenção da Holanda. 5

Villa: totalmente sumido do jogo, teve apenas uma boa chance de concluir. Devido ao modo em que a defesa holandesa jogou, se viu muitas vezes em posição irregular e sem saber por onde se meter. 5

Fabregas: entrou e foi um dos jogadores mais importantes em campo, não somente devido ao passe para o gol de Iniesta, mas também em outras inúmeras participações. 8,5

HOLANDA

Stekelenburg: a única bola em que não poderia fazer nada foi o gol de Iniesta. Pelo menos três excelentes defesas durante o jogo. 9

Van der Wiel: quase não aportou ofensivamente, mas foi simplesmente impecável na defesa, principalmente na marcação à Villa. 8

Heitinga: atuação perfeita do zagueiro do Everton que infelizmente acabou com sua expulsão. 8

Mathijsen: sem dúvidas foi um dos melhores zagueiros da competição. Quase marcou um gol e foi decisivo na manutenção do zero no placar holandês. 8,5

Van Bronckhorst: assim como Wiel quase não subiu ao ataque. Desempenhou uma função mais defensiva e o fez com correção. 7

Van Bommel: volante de muita qualidade técnica, mas que também pode ser um volante de Bagé dos anos 50. Provoca, bate, catimba, enfim, tem o temperamento de um jogador sul-americano, um volante uruguaio. 8,5

Sneijder: mais se dedicou ao esquema tático do que brindou o time com sua reconhecida qualidade técnica. Deu um passe virtuoso para Robben. 7

Kuyt: jamais encontrou seu lugar no campo, sempre se via metido entre mais de um jogador adversário e não conseguiu sucesso em suas empreitadas. 4

Robben: durante os 120 minutos foi o jogador mais perigoso em campo. Perdeu dois gols que se repetirão em sua cabeça durante muitos anos, mas deve ser louvada sua função tática e sua facilidade de desorganizar e abrir espaços nas defesas adversárias. 8,5

Van Persie: uma das grandes decepções da Copa. Faltou-lhe atitude para encarar uma final de Copa do Mundo. 3

sábado, 10 de julho de 2010

Ginetes da Cocaína

Que a Colômbia é o maior produtor de cocaína do mundo eu e todo mundo já sabia. Que muitas coisas aqui foram construídas patrocinadas com o sujo dinheiro do tráfico internacional de drogas, também já sabia.

Apesar de ainda não ter feito o “tur Pablo Escobar” que é a atividade turística mais procurada por estrangeiros em Medelín e que consiste em visitar lugares que tiveram alguma relação com o maior traficante de drogas da história, na primeira vez em que vim à Colômbia, pude ver algumas coisas curiosas. Espalhadas pela cidade há construções imensas abandonadas, pois foram iniciadas pelo Cartel de Medelín e, com o desmantelamento deste, foram abandonadas. Obviamente eram obras que tinham como único objetivo a lavagem de dinheiro.

Mesmo com todo esse conhecimento que creia ser muito vasto sobre o que representa o tráfico de drogas nesse país, confesso que, depois de ler o livro “Os Ginetes da Cocaína”, escrito por um jornalista colombiano durante os anos 80, me dei conta de que não tinha a mínima ideia da proporção em que o tráfico de drogas dominou e ainda domina esse país. A conclusão que tive após a leitura desse livro de menos de 300 páginas foi que vivo em um país que foi totalmente construído com o dinheiro do narcotráfico.

O grau de importância e de dominação que os poderosos cartéis colombianos atingiram durante o final dos anos 70 e princípios dos anos 80 foram responsáveis pela transformação de um país. Cidades como Medelín e Cali e até Miami, deixaram de ser cidades planas e rasteiras e passaram a ser canteiros de obras. A leitura desse livro me saciou algumas inquietudes que eu tinha aqui.

Para que entendam, explico um pouco como é dividida socialmente Medelín.

Metida entre morros, a cidade não tem muito para onde crescer. Assim como no Rio de Janeiro, toda a pobreza e parcelas da classe média estão localizadas nas montanhas que circundam a cidade. Na parte plana, amontoam-se carros e edifícios. Vale lembrar que Medelín possui uma área que é a metade de Porto Alegre, mas com um milhão de habitantes a mais.

A ideia de “bairro” aqui também é muito distinta a de que temos no Rio Grande do Sul. Um bairro aqui normalmente é associado a uma região popular da cidade. O meu “bairro” que ninguém chama de bairro, é onde se vive toda a classe média alta, a elite e parte da classe média.

Outro fator que torna difícil utilizar o termo “bairro” é que, essa região, é gigantesca. Há centenas de edifícios e toda essa parcela privilegiada se amontoa nesse mesmo espaço. Essa parte da cidade se localiza numa parte alta que é relativamente nova. Fora daqui, na parte plana, são bairros modestos ou pobres e, em algumas partes, classe média e alta, mas são minoria.

O fato é que tinha essa inquietude que manifestei anteriormente que consistia em olhar essa selva de pedras ao meu redor e não ver sequer um edifício com uma aparência de ter 30 anos. Tudo é novo.
Tudo é novo e todo esse novo tem relação direta com a explosão do negócio das drogas.

No início do narcotráfico na Colômbia, basicamente duas famílias tinham destaque: Escobar e os Ochoa que, diga-se de passagem, são meus vizinhos e hoje dizem não ter mais negócios irregulares.

Essas duas famílias foram as que fizeram do negócio das drogas um fenômeno lucrativo jamais visto na história desse país. Aliadas a guerrilhas de zonas rurais, transformaram uma planta que não valia mais do que uma erva-daninha em uma máquina de fazer dinheiro.

Ao mesmo tempo em que ganhavam muito dinheiro, também gastavam muito dinheiro “investindo” em seus negócios. Para isso, como se tratava de um negócio que tinha seus consumidores finais fora do país, eram obrigados a negociar e ter suas relações internacionais em diferentes países, mais fortemente nos Estados Unidos e na Espanha.

Os governos americanos e de países europeus, ao sentir o crescimento vertiginoso desse bando de delinquentes latinos, começaram a aumentar o combate a essa nova onda de terror que pedia passagem. Muitos narcotraficantes foram presos, muitos carregamentos de drogas foram destruídos e a eficiência e a dificuldade que esses governos lhes impunham fizeram com que os grandes cartéis chegassem a uma temerosa conclusão: deveriam “comprar” o país (Colômbia) e lá estabelecer todo o mecanismo do tráfico.

A “compra” da Colômbia foi, para mim, uma das coisas mais impressionantes que já tive conhecimento. A leitura desse livro pode ser uma comprovação que tudo tem um preço e que a maioria das pessoas é corruptível. Todas as esferas da sociedade colombiana foram transformadas em braços do narcotráfico. Juízes, imprensa, políticos, líderes comunitários, polícia, governo, esporte, festas populares, turismo, transportes, comércio, bancos, enfim, tudo passou a ser parte de uma organização que tinha claro em sua cabeça um plano incrivelmente eficaz de comprar um país.

Pablo Escobar, por exemplo, era político, tinha um cargo público. Sua campanha era feita através de doações em bairros populares. Era uma espécie de Robin Hood, era idolatrado nas famosas “comunas”, as favelas de Medelín. Organizava eventos, dava comida, dinheiro e assim construía uma legião de admiradores que tinham o poder de elegê-lo.

Mas por que Pablo Escobar queria ser político se tinha quase toda a classe política comprada? Pode soar incrível, mas o benefício maior que Escobar queria ao ser um “homem público” era o visto americano e a imunidade parlamentar.

É interessante no livro a maneira em que o autor cita um tal Álvaro Uribe Vélez, narcotraficante e senador à época. O senhor em questão era o pai do atual presidente colombiano.

Essas conexões com a política atingiam todos os setores, até a presidência do país. O autor dá provas concretas dos vínculos dos narcotraficantes com todos os presidentes colombianos da época.

Essas relações pornográficas com o poder público rendiam muitas facilidades para a operação dos “capos” do narcotráfico, como autorizações para terem exércitos particulares com soldados cedidos pelo governo, por exemplo. Também lhes oferecia conexões diretas com a grande maioria dos cônsules e embaixadores colombianos em países estratégicos que acabavam exercendo um importante trabalho juntamente com os cartéis principalmente na hora de evitar prisões e/ou extradições de narcotraficantes procurados no exterior.

Tendo o setor político do país ao seu dispor, havia-se de controlar também a imprensa que em muitos casos pode ser um estorvo em meio a atos criminosos.
Se comprar toda a camada política do país foi fácil, a imprensa não foi diferente.

Alguns narcotraficantes chegaram ao ponto de ter seus próprios meios de comunicação como estações de rádio ou jornais. Um desses jornais era conhecido por sempre exaltar as benfeitorias realizadas por Escobar em Medelín.

Evidentemente houve políticos e jornalistas que se opunham a esse escândalo. O destino deles foi óbvio: o assassinato cometido pelos conhecidos “sicários” de Escobar. O jornalista que escreveu o livro o fez em homenagem ao seu chefe que sempre foi ferrenho na explicitação dos crimes cometidos por narcotraficantes e políticos corruptos em seu país e que acabou também brutalmente assassinado.

Outro aspecto importante a ser resolvido pelos narcotraficantes era a lavagem do dinheiro proveniente da droga. Para isso, compraram o comércio e o sistema financeiro do país.

Desde redes de farmácias que, vale destacar, chegavam ao ponto de alterar medicações destinadas a crianças até bancos e sindicatos, passando por revendas de carros importados, lojas, xópins e até parques infantis, tudo era controlado pela máfia colombiana e tinha como único objetivo a lavagem de dólares.

Alguns atos dos narcotraficantes descritos no livro me chamaram bastante a atenção e mostram bem essa megalomania tradicional dessas pessoas. A gana de serem donos do mundo os levava a atos simplesmente inacreditáveis.

Todo o futebol colombiano era controlado por mafiosos. Os criminosos viram nos laços internacionais que o futebol oferece uma oportunidade única de lavar seu dinheiro sujo. Começou, de uma hora para outra, uma corrida de diferentes grupos criminosos pela compra de clubes de futebol da primeira divisão colombiana. Além dos clubes, os passes da maioria dos jogadores eram adquiridos por essas organizações.

O resultado disso foi uma série de campeonatos com suspeitas de manipulação de resultados e consequente perda de interesse da população pelo futebol local que se pode sentir até hoje em meio às pessoas que viveram essa época.

A coisa era tão série que o órgão que controlava o futebol colombiano, chamado Dimayor também era gerido pela máfia e que chegou ao cúmulo de suspender uma rodada do Campeonato Colombiano como forma de luto pela morte de um conhecido narcotraficante da época.

Mas não foi apenas o futebol alvo da cobiça dos traficantes. Pablo Escobar patrocinava através de suas inúmeras empresas lavadoras de dinheiro a seleção colombiana de ciclismo que é o segundo esporte mais popular do país. Inclusive foi Pablo Escobar quem bancou a ida da delegação colombiana ao famoso Tour de France.

E a voracidade esportiva não parava por aí. A maioria dos autódromos colombianos foi construída com dinheiro sujo. Houve um caso incrível de pilotos colombianos presos no exterior por utilizarem seus carros para transportar cocaína.

O primeiro hipódromo do país também foi construído pela máfia, mais precisamente pelo clã dos Ochoa que era fascinado por cavalos.

Deixando o esporte de lado, talvez o setor da sociedade mais cobiçado pelos narcotraficantes era o de aviação e por motivos óbvios. No livro o autor coloca em seu apêndice uma lista de todos os aeroportos clandestinos do país bem como o registro de todos os aviões utilizados pelo narcotráfico. Inúmeras companhias aéreas foram criadas ou compradas por organizações criminosas, não somente na Colômbia, mas
também nos Estados Unidos e em países da América Central e África que são portas de entrada para os grandes mercados americano e europeus. O mais incrível quando comentamos sobre a aviação é que essas organizações chegaram ao cúmulo de possuir imensos hangares localizados não apenas no meio da floresta, mas dentro do principal aeroporto do país, o El Dorado de Bogotá.

No entanto o setor da sociedade onde a máfia estava também presente que mais me chocou foi o setor universitário. O governo da época era tão corrupto que chegou ao cúmulo de aprovar licitações feitas por parte de grupos e pessoas reconhecidas por seus claros vínculos com o narcotráfico para a construção de universidades!

Há um caso espetacular narrado pelo autor em que, em uma universidade colombiana, o reitor autorizou uma exposição de cavalos de um mafioso reconhecido internacionalmente. Esse mafioso tinha como sua marca registrada o número oito que colocava em todos os seus bens, desde os pacotes de cocaína até seus carros e cavalos. Quando os alunos viram que os cavalos em questão tinham o número oito gravados em seus corpos começaram uma espécie de protesto. Em seguida, os guarda-costas do mafioso deram tiros para o ar e a situação foi prontamente acalmada. Isso aconteceu DENTRO de uma universidade.

A conclusão que se chega ao terminar o livro é a de que, se não fosse pelo dinheiro que ainda é injetado nesse país pelo narcotráfico, a Colômbia estaria em uma situação ainda pior, seria uma espécie de Bolívia. Também se pode notar ao conviver com a média da população colombiana que essa mentalidade criminosa não é posse exclusiva de narcotraficantes de fato e sim se manifesta de diferentes maneiras, em toda a população do país. O pensar em si mesmo antes de todos não importando se haverá terceiros prejudicados, o culto ao dinheiro fácil, a adoração a bens materiais extravagantes como carros esportivos, a ideia de estar cercado por mulheres, a ideia de sempre buscar uma maneira fácil de atingir determinado objetivo de querer tirar vantagem em todas as situações, assim é a sociedade colombiana, uma sociedade que se acostumou com o narcotráfico e que não recrimina as pessoas que são partes diretamente disso com a intensidade necessária.

Segue também uma espécie de obsessão por esse ideal de vida, a grande maioria ainda é viciada ao narcotráfico, as novelas mais populares são as que envolvem histórias de cartéis e “capos” da droga, tem-se ainda muito vivo no país a admiração pelos logros sujos do período negro colombiano que ainda existe, mas mais discretamente.

Ao mesmo tempo, em uma atitude totalmente hipócrita, lamentam-se ao se verem de frente com problemas como dificuldade na obtenção de vistos ou preconceito sofrido no exterior.

Há uma frase clichê que, para mim, é uma verdade quase que inquestionável na maioria das situações: todo mundo colhe o que planta e a população colombiana colhe as chagas de não ter se rebelado contra o absurdo de um país dominado pelo crime organizado.