Desde maio não escrevia sobre a vida em Medelín. Já começam a escassear as diferenças sociais ou culturais. O texto de hoje é dividido em duas partes: a primeira mostra um pouco da violência colombiana e a segunda segue a linha dos oito textos anteriores.
Sobre a violência, olhem essa notícia: nesse ano, a guerrilha já matou 104 CRIANCAS que são encontradas enterradas nas zonas rurais do país que, como já devem saber caso sejam leitores assíduos, são extremamente atrasadas e muitas partes são dominadas pelas guerrilhas.
Outro fato que me chocou foi o tal “falso positivo”. Os soldados do exército colombiano obtêm benefícios quando matam guerrilheiros, até aí nada de se surpreender em um país que simplesmente ignora tratados internacionais de direitos humanos. Mas o tal “falso positivo” é uma ação em que os soldados matam CIVIS em troca dos benefícios que, teoricamente, deveriam ser dados em caso de morte de guerrilheiros. Na falta de êxito na busca por vítimas guerrilheiras, matam-se civis. Incrível.
Chega de violência, vamos a comédia da vida colombiana.
Já comentei sobre a terrível pronúncia dos hispânicos para com a língua inglesa, ou, melhor dito, em qualquer idioma. Aqui, não se manda um fax, senão um “faz”. O “x” ao final das palavras vira “z”.
Outro hábito extremamente curioso e ignorante é descer lombas com o carro engatado na segunda marcha. Ninguém usa ponto-morto aqui, inclusive há placas de trânsito sugerindo descer lombas em segunda. Quando estou num táxi sinto uma dor na alma ao sentir que o motor do carro está prestes a explodir.
Outro sufoco que eu passo aqui é quanto aos lugares fechados. Há ar condicionado em nenhum lugar, mas muitos lugares, devido às típicas construções colombianas, não têm janelas, ou seja, é um campo de concentração. E o pior é que lugares que trabalham com saúde, como consultórios médicos e odontológicos, também possuem as mesmas desumanas condições. Esses dias fui com a Marcela ver umas roupas que uma cidadã aqui vende. Estávamos em um quarto de uns 3m por 3m com mais 5 pessoas dentro, sem janelas e, óbvio, sem ar condicionado ou ventilador. Para completar, alguém fechou a porta. Juro que vi a morte de perto, cheguei a sentir a mão da morte tocando meu ombro, senti o frio de sua foice. Comecei a suar frio que é uma das piores sensações do mundo e só não saí antes do cubículo para não causar a ira em alguém... E o pior de tudo: os indiozinhos nem reclamam, não sentem JAMAIS calor ou qualquer desconforto.
Outro fato incrível é a quantidade de acidentes de trânsito. Bom, nem tão incrível se considerarmos que há muitos carros, péssima sinalização, ninguém usa pisca-pisca e ninguém cumpre regras aqui, inclusive as de trânsito. O resultado é fantástico. Só hoje no trajeto de 10 minutos para o trabalho vi dois acidentes. Não passo um dia ser ver ao menos um. E todos os carros têm arranhões na lataria, ninguém se salva.
Para completar, uma constatação social. O povo aqui é evidentemente mais aberto que o povo gaúcho. Chamam-se de “meu amor”, “coração” a qualquer um, fala-se com qualquer um, todo mundo se comunica, todo mundo é amigo. No entanto, não há amizades verdadeiras, daquelas que são como família, aliás, nem com familiares há aquela total confiança que temos. Exemplifico.
Se um amigo vem visitar, arruma-se a casa, as mulheres se maquiam e sugerem aos homens colocar uma roupa melhor e não ficar com a surrada que veste em casa. Há sempre um ar de preocupação com possíveis críticas e fofocas que podem originar por uma simples visita.
Para sair então, a mesma coisa. Não existe levantar do sofá e ir no supermercado. Há que colocar uma roupa melhor pois um amigo pode ver e comentar com os demais e já vira algo penoso, uma fofoca.
Aqui para receber a mãe em casa, mesma coisa. Deve-se arrumar tudo, pois senão vai sair falando mal. Sinto falta de ter relações onde há 100% de confiança. Se a minha casa está um lixo, o amigo vem, constata sem titubear que a tua casa está um lixo e vai embora, mas não irá comentar o fato com outros.
Muito disso é o resultado da grande futilidade que rege a vida das elites aqui, não posso afirmar que nas classes populares funciona da mesma maneira. Mas, sou obrigado a confessar, sozinho, vou ao supermercado de bermuda e chinelo.
sexta-feira, 19 de junho de 2009
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