Em um aspecto viver na Colômbia é como retornar à infância. Aqui, não decido aonde vou. Meu direito de ir e vir é limitado. Devido ao fato de estar começando uma vida aos 26 anos, e também devido ao fato de ser uma pessoa avessa a novas relações pessoais, tenho uma vida social bastante limitada. Não decido aonde ir; apenas vou onde sou convocado.
Um ex-colega de faculdade da Marcela, homossexual, cocainômano e metrossexual, encontrou, em alguma investida sua em busca de homem em uma favela, uma família de crianças belíssimas. Três guriazinhas lindas e um guri. Todos com uma aparência atípica em uma terra de crianças feias. Olhos azuis, cabelos loiros, essas crianças realmente chamam a atenção.
Ter encontrado essas crianças em um antro de criminalidade, miséria e violência fez com quê o cidadão em questão visse a sua chance de ganhar dinheiro fácil. A Colômbia, e especialmente Medelín, possui um mercado de moda muito forte e, obviamente, a figura dos modelos é destacada. Vale salientar que a Colômbia não segue um padrão de beleza de modelos tradicional, ou seja, mulheres magras e caucasianas, e sim prezam por fêmeas fartas e curvilíneas.
Devido a sua metrossexualidade e conseqüente relação com o mundo da moda, o nosso amigo não perdeu mais do que um minuto até decidir “adotar” essas pobres crianças.
Levou-os em agências de modelos infantis, todos já desfilaram e realizaram trabalhos e agora, sob uma campanha de construir uma casa às crianças, realiza eventos para arrecadar fundos para isso. Sexta-feira passada estive presente sendo testemunha in locus da barbaridade que está sendo feita com essas indefesas crianças em um ato disfarçado de “ajuda humanitária” tão crível como a “ajuda humanitária” americana no Kweit durante a Guerra do Golfo.
Pagamos cerca de R$40,00 para entrar a uma discoteca. Evidentemente, não pude escolher e fui induzido a fazer parte desse ato obsceno. Na discoteca, para a minha surpresa, encontrei as crianças. Uma guriazinha, de cerca de cinco anos, estava na porta recebendo os convidados. Era obrigada a agir como uma diva e distribuir beijos a todas as pessoas que adentravam no recinto.
Saliento mais uma vez que se tratava de uma discoteca, com venda de bebida alcoólica e música mais do que alta, beirando o insuportável. E sim, as crianças circulavam livremente por lá. Em qualquer país que almeja a ser civilizado, crianças jamais seriam permitidas dentro de uma discoteca, mas na Colômbia tudo pode.
A festa se arrastava, música ruim e alta, calor insuportável até que, para a minha tristeza e decepção para com a Humanidade, uma mulher na faixa dos 30 anos de notória vida devassa, uma possível fracassada drogada, sobe a um pequeno palco e chama, em meio a incessantes microfonias, as crianças a subirem no palco, isso já perto da meia-noite. Para que vocês me entendam, a menor delas tem uns dois anos de idade e estava visivelmente assustada.
Todas sobem no palco e são obrigadas a dançar para “divertir” o público que exigia a recompensa pela ajuda que estavam dando com seus R$20,00 de ingresso. Todos sorriam.
Tiravam-se fotos. As pobres meninas dançavam timidamente, infantilmente. A que estava na porta recepcionando os crápulas, dizia em tom ameaçador à outra de cerca de quatro anos: “Baile! Baile! Tienes que bailar!”
Com exceção da Marcela e eu, todos sorriam, todos estavam achando o máximo comprovando que se trata de um povo com zero senso crítico, povo sujo e corrompido.
Entre goles de cachaça, sorriam para as pobres crianças que os divertiam aquela noite.
Ao fim da triste apresentação, sobe ao palco o canalha organizador com seu terno branco com capuz e sapatos também brancos e pontudos estilo Peter Pan e abraça o guri. E sorri.
Impossível não questionar a filantropia desse cidadão. Por que não ajudar crianças pobres E FEIAS que terão menos chances de sair da merda que essas pobres, MAS LINDAS? Com ou sem a ajuda desse sanguessuga, essas crianças inevitavelmente viriam a ter muito mais chances em uma sociedade que tanto valoriza a aparência quando comparadas aos seus vizinhos feios e com traços indígenas.
Não posso deixar de comentar que, nesse evento para ajudar e COM A PRESENCA de crianças, houve um xou musical hediondo de um travesti que depois chamou ao palco duas “amigas” sendo que uma era visivelmente infectada, deveria pesar cerca de 30 quilos. Nada mais propício de se ter em uma festa para e COM crianças.
Realmente é difícil ser detentor de valores. É difícil não conseguir desfrutar de um crime contra crianças; é difícil ver um abuso de menores e sentir-se ofendido, ultrajado. É, também, insuportável saber que patrocinei a cocaína de um canalha, um vigarista com pinta de cafetao barato de nariz operado.
É, para finalizar, duro ver uma criança de cinco anos de idade dançando reggaeton (ritmo criado em Porto Rico – preciso dizer algo mais? – que é uma espécie de versão latina do hip hop americano, ritmo favorito de vadias e de gângsters wannabes, público numeroso por aqui) em cima de uma mesa, depois da meia-noite em uma discoteca e, ainda por cima, contava com a parceria de um idiota asqueroso que lhe fazia companhia, o mesmo idiota que usava batom na igreja (essa é para leitores assíduos).
Eu, cada vez mais, desisto da Humanidade e temo em por filhos nesse mundo lixo. Princípios, exijo a volta dos princípios...
terça-feira, 21 de julho de 2009
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Um comentário:
Cara, acabei de achar o teu blog através do Orkut de uma amiga... Fiquei surpreendido com o que eu acabei de ler. Realmente, lastimável. Não existem direitos da criança aí? E as autoridades o que fazem diante disto?
Abraços, tenha uma ótima semana.
Paulo Vinícius.
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