sábado, 10 de outubro de 2015

O Mundo das Contradições

A sociedade brasileira é das mais contraditórias do planeta. É difícil para um amante da lógica de pensamento encontrar qualquer resquício de coerência no dia-a-dia brasileiro. O mundo inteiro está chocado com a bárbara foto do menino afogado no Mediterrâneo e os brasileiros também o estão. Em uníssono grita-se por maior colaboração do planeta para com os pobres bebês que morrem afogados tentando escapar da barbárie síria e em outros países. Estas mesmas pessoas são as que criticam o governo por receber imigrantes haitianos ou médicos cubanos. Acusa-se o tal governo “comunista” de ajudar a escória enquanto já temos suficientes problemas dentro do território nacional.

Estas mesmas pessoas que clamam por justiça após ver a chocante foto do bebê morto, são contra qualquer tipo de ajuda social por parte do Estado. Bolsa-família é esmola para comprar os votos da nossa escória tupiniquim. Um bebê que é flagrado morto afogado em uma praia ensolarada choca a qualquer humano e o faz simplesmente por um motivo: pela força da imagem que, como dizem, vale mais que mil palavras.

Não creio que o governo federal brasileiro algum dia irá, em um momento de desespero, publicar fotos de crianças subnutridas dos mais variados rincões desses país. Obviamente seria totalmente contra tal ação, mas seria a única forma de convencer a elite nacional indignada pelo infante afogado de que também se “afogam” infantes dentro do país e que as migalhas que o governo de esquerda (?) do PT dá aos miseráveis é questão de humanismo.

Ainda falando em contradições, o Brasil voltou a testemunhar a famigerada “marcha da família” que não passa de um bando de delinquentes de Miami clamando pela volta da barbárie da ditadura militar que, diga-se de passagem, também afogava, não sei se crianças, mas sim pessoas que simplesmente eram contra o governo, este sim, jamais eleito pelo povo. Afogava-os em troca de informação, em uma espécie de delação não-premiada. Estes dementes defendem, como também o faz nossos gatos-pingados das manifestações fashion, o Estado mínimo, que somente deve aparecer para salvar empresas privadas. Não querem mais impostos, consideram “autodefesa” e, claro, são totalmente contra as migalhas aos menos aquinhoados, mas não se importam com os lucros exorbitantes dos bancos em tempos de crise e muito menos se importam com o dinheiro dado de lambuja pelo BNDES para os grandes agricultores e construtoras, estas mesmas que alimentam a corrupção política nesse país. E há de se dizer que estes mesmos contrários ao Estado defendem que este se intrometa nas questões de comportamento como casamentos de pessoas do mesmo sexo ou aborto, aí sim o Estado deve se meter.

No entanto a contradição não é exclusividade brasileira, se a vê todos os dias em um mundo que vive um dos seus piores momentos desde o final da Segunda Guerra. O mundo das superpotências ocidentais semeia e arma grupos de psicopatas do deserto e depois os bombardeia e lamenta o êxodo (e os afogamentos) de seus cidadãos em busca de ar em terras mais abastadas. Não me canso de me perguntar: por que os Bushes, Toni Blair e David Cameron, por exemplo, não estão atrás das grades? 

Por que o mundo inteiro aprendeu a odiar o odiável Saddam Hussein e Osama bin Laden, mas não tem o mesmo sentimento contra criminosos ainda maiores que passam por bons moços apenas porque são brancos, católicos e ocidentais, fardam Armani e falam inglês? Quem criou a besta bin Laden? 

Quem é o pai intelectual de Saddam? Quem armou o EI? Nós, os brancos ocidentais e agora não sabemos o que fazer com as consequências de erros que jamais foram punidos e que terá como consequência a diminuição da qualidade de vida de seus próprios povos que terão suas terras invadidas por milhões de desesperados.

Todos nós parecemos cair nessa absurda e falsa retórica de que vivemos uma cruzada do ocidente civilizado contra os bárbaros barbudos. Temos assim tanto espírito de busca por uma sociedade livre de facínoras? Será? O governo mais cruel do planeta é, talvez, o governo monárquico hereditário da Arábia Saudita onde mulheres são apedrejadas e homens têm suas mãos cortadas e suas cabeças decepadas em praça pública. Alguém já escutou de algum plano de bombardeio contra o rei saudita? 
Jamais, já que é um dos principais aliados do Estados Unidos e são, para completar, os credores maiores da dívida pública desse país, deixemo-nos em paz já que tem governos democraticamente eleitos como na Ucrânia, Venezuela e Egito que nos incomodam mais e vendemos como os bárbaros e dizemos que estes devem se “alinhar” aos nossos preceitos de liberdade de expressão e democracia.

Tudo segue igual. No século passado o Estados Unidos patrocinou todas as ditaduras sul-americanas enquanto que os europeus mais importantes mantinham seus sanguinários ditadores no poder de suas colônias africanas. Hoje nós, ocidente defensor do mundo “livre” patrocinou a derrubada de um presidente ucraniano democraticamente eleito, também derrubamos um presidente egípcio democraticamente eleito depois de décadas e sinto cheiro de golpes contra governos democraticamente eleitos como na Venezuela e, claro, no Brasil. São estes governos citados defendíveis por sua competência? Óbvio que não. Tanto na Ucrânia quanto no Egito, Venezuela ou Brasil, vimos ou vemos governos sendo corroídos pela corrupção e por desmandos equivocados, mas se vamos apoiar a queda de qualquer governo por corrupção ou equívocos, que isso seja válido para todos, começando pela Arábia Saudita e passando pelos criminosos de guerra mentirosos como Bush e Blair/Cameron. Nossos indignados de Miami vêm com esse absurdo argumento das tais “pedaladas fiscais” praticadas por TODOS os presidentes do Brasil desde Getúlio para exigir o impeachment de Dilma, mas com certeza não se importaram com a mentira americana de Bush para invadir o Iraque em nome das tais armas de destruição em massa que simplesmente nunca existiram.


Aumento da desigualdade mundial, crise de imigração em níveis estratosféricos, América Latina com sua sociedade fervendo na maioria dos países, mundo árabe se encaminhando para a oficialização da barbárie, aumento da cobiça soviética por suas ex-colônias, bebês morrendo afogados e uma população cada vez mais convencida de que empilhar bens e produtos vendidos como necessários por um capitalismo ávido por consumismo, o fracasso no combate às drogas, recordes e mais recordes no aumento da temperatura mundial, sem contar outros fatores, me fazem crer que fracassamos completamente como sociedade em todos os sentidos e que nosso futuro será somente pior e pior se nada for feito. E não será.