terça-feira, 20 de dezembro de 2011

Barcelona, Messi E Companhia vs Ninguém

Antes de começar a falar da estapafúrdia comparação entre Messi e Neymar e do jogo entre Barcelona e Ninguém (Santos) preciso introduzir comentando sobre dois fatos, duas características desse país. O primeiro fato é apenas de se lamentar. A classe de jornalista esportivo brasileiro é a classe profissional mais incompetente desse país. Explico. Um médico especialista em cirurgias do dedão do pé direito, por mais que sua especialidade seja essa, ele saberia sim, operar um dedão do pé esquerdo e até o dedo indicador de uma mão canhota. Esse mesmo médico acompanha o que acontece no mundo de sua profissão, não somente no que ocorre no consultório do vizinho, mas em novos estudos provenientes de diferentes continentes do planeta.

No entanto, o jornalista gaúcho sabe apenas o que anda acontecendo em dois recintos: Olímpico e Aterro. Os jornalistas de São Paulo, por mais que achem que vivem numa cidade cosmopolita, sabem apenas fatos e fofocas dos quatro grandes clubes do estado e por aí vai. Evidentemente que não exijo que os cidadãos normais e comuns sejam como eu que assiste uma média de 15 jogos por semana, mas sim exijo essa atitude dos profissionais, dos jornalistas esportivos. Tiro o chapéu para os profissionais coerentes e bem informados da ESPN, mas, fora eles, nada, um deserto de profissionalismo que gera situações bizarras como é a que deu motivo para esse texto que já irei analisar mais profundamente, as comparações de Barcelona e Santos e Messi e Neymar.

A outra característica que anunciei é o ufanismo. Se o Brasil fosse um país de passado e/ou presente bélico, estaríamos em grande perigo. Excetuando-se terras pitorescas e bizarras como Líbia e Coreia do Norte (RIP Kim), por exemplo, não há país no planeta e agora me refiro ao mundo ocidental democrático, que ainda tenha uma sociedade imersa em um ufanismo nojento e que até perigoso seria em outras circunstâncias sociais. Aliás, no Pan-Americano do Rio de Janeiro eu confirmei o meu temor e vimos cenas doentias de agressões físicas a delegações adversárias que ousaram ganhar do Brasil “Ame-o ou deixe-o”. Não me esqueço das agressões contra o time de handebol argentino ou contra o grupo de judocas cubanos. Ambos cometeram um simples crime: ousar ganhar do Brasil em território tupiniquim.

Esse ufanismo galvaobuenístico somado à ignorância da mídia e ainda ao fato de que brasileiro não vê futebol que não seja do seu próprio time, gerou esse movimento débil mental que se divide em duas partes: o período pré-final do Mundial Interclubes e o de agora, essa ressaca depois da surra-treino de Yokohama.

Desde que cheguei aqui a imprensa ufanista e aí não me refiro somente à paulistada e cariocada, mas também a imprensa gaúcha que cada vez mais veste e vende a ideologia “Santos é Brasil” e afins, discutia sobre quem era melhor, Messi ou Neymar. O tema da discussão é tão estapafúrdio que fica difícil de entender como pode ser sustentado, mas sim, eu consigo entender. O futebol brasileiro estava em crise desde os princípios dos anos 70 até 1994 quando o Brasil ficou 24 anos sem ir a uma final de copa. Após a conquista, todo o mercado da bola no país se aqueceu: melhores salários, mais audiência, mais público nos estádios, tudo, relacionado ao futebol, melhorou com o título de 94. Quê conclusão se tira disso? O futebol, como mercado, depende do desempenho do Brasil em copas, não há dúvidas.

Depois de 94 o Brasil vem tendo excelentes desempenhos em copas e muitos craques foram aparecendo. No entanto, desde a lesão do Kaká, o Brasil ficou órfão de craques de nível internacional e hoje o seu único grande talento lá fora é Dani Alves, um lateral. Isso dá prejuízo quando se analisa o futebol como um produto midiático. Necessitam-se ídolos para que o futebol dê audiência e gere mais lucros e a Globo, a grande madrinha do futebol brasileiro, a responsável por muitas coisas como jogos em “horário de boate” e direitos de transmissão do campeonato sem licitação, precisa vender o produto “futebol brasileiro” e para isso precisa de ídolos. Não os há. É um momento de crise. E em momentos de crise se inventam ídolos como Massa, Barrichelo, vôlei, Popó, Robinho, Ganso, Guga, e agora, para completar e tocar o fundo do poço, os boçais do UFC. Não importa se o esporte é do gosto do povo, o que importa é ter ídolos que depois a mídia/Globo “populariza” o esporte e o vende.

Neymar é o nome da vez. Ao que parece, é um excelente jogador. Até aí tudo bem. No entanto, ser um jovem excelente jogador não vende e por isso criou-se a campanha “Neymar Melhor do Mundo”, uma das maiores campanhas propagandísticas brasileiras de mídia do século. Desde já afirmo que gosto de Neymar, acho um grande potencial, MAS ainda é jogador em formação. Não está entre os melhores, não se pode afirmar nada a respeito dele enquanto não estiver jogando entre os melhores. E a mídia seguiu. Começou a compará-lo com Messi, o maior jogador do mundo e que só pode gerar discussões sobre se ele é o maior de todos tempos, se está entre os três maiores, entre os quatro, se é melhor que Maradona e etc. Não há comparação. Nunca houve comparação. É sem sentido compará-los. Comparar o Messi com o Neymar é como dizer que a criança que é a melhor da aula de ciências na quinta série é mais genial que o prêmio Nobel de física. É outro patamar. É outra realidade. Neymar joga numa região em que o melhor time do continente não toca na bola jogando contra o melhor do continente do Messi. Não estou dizendo que o guri da quinta série craque em ciências tem nenhuma chance de ganhar um Nobel, assim como não posso afirmar que Neymar não será um craque mundial. Ambos podem vir a ser, apesar de que, opinião pessoal, isso é impossível, mas podem ser sim. Não obstante, nesse momento, a comparação é descabida, bisonha, patética, criminosa, pornográfica.

Messi joga e faz mais que Neymar jogando entre os melhores. Neymar faz menos que Messi jogando contra adversários sumamente inferiores aos que Messi enfrenta. E por que isso não é opinião de todos, só minha e de outros poucos? Porque a grande maioria da população, inclusive a classe de jornalistas esportivos viu o Barcelona jogar ao vivo pela primeira vez. Todo mundo sabia que o time era bonzinho, mas poucos o tinham visto jogar. Tratando-se da população civil, não é problema, mas inaceitável quando me refiro à mídia que não se cansava de repetir que seria um jogo entre iguais e para isso se montavam nessa teoria furada e ufanista de que aqui se joga melhor que em qualquer outro lugar. O Barcelona era visto apenas em cinco ou dez segundos em programas esportivos quando se mostra alguns gols do time e, somando-se a arrogância brasileira de se achar o melhor em tudo, o povo e os jornalistas que se igualam ao povo em conhecimento tinham a ideia de que era algo falso, enganação que aqui sim é que se joga futebol, eles fazem outra coisa.

Aí entra a segunda etapa, o pós-jogo. Todos esses ignorantes e isso não é ofensa são simplesmente pessoas que ignoravam o Barcelona jogando futebol, estão pasmas. Demoraram quase quatro anos para ver um fenômeno que não acontece todos os dias. Mais uma vez salvo os civis, mas jornalistas esportivos que pagam suas contas com o futebol demoraram QUATRO anos para ver esse time mágico jogar! Deixaram de ver mais ou menos uns 300 jogos de um time que, pelo menos para mim, é a maior formação futebolística de todos os tempos! E eles vivem disso! Azar o deles, tenho pena de quem, gostando de futebol, começou a ver essa maravilha semana passada, pena. Entendo a paixão clubística, tenho a minha, mas tenho pena de gente que gosta de ver futebol passando a vida toda vendo dupla GRE-nal jogar e afins e perdem uma chance única de encher os olhos duas vezes por semana.

O mais engraçado é que nem ruborizam agora, todos falando sem falar sobre a tal maravilha recém descoberta. Reportagens e mais reportagens sobre como o Barcelona chegou nesse patamar. Ignorantes que nem sabiam quem era o Iniesta falando sobre o trabalho e a filosofia Barcelona. Não ficam nem vermelhos.
Chega, não quero mais. Fica a lição, fica a lição de humildade e de profissionalismo.

Felizmente vou-me embora pra Pasárgada em janeiro e me livro de escutar tanta asneira e conviver com tamanha incompetência. Não posso terminar sem dar minha opinião sobre como eu, como técnico do Santos, entraria para essa decisão. Muricy errou, entrou com todo o time atrás para não perder. É erro. A atuação do Santos foi absurda. O placar é totalmente aceitável, mas a atitude e o erro de Muricy não o são. Contra o Barcelona se aperta a saída de bola enquanto há fôlego, isso dificulta. Muricy preferiu esperar e viu uma máquina imparável passar 80% do tempo em volta de sua área. O Santos não fez faltas, faltou sangue. O Estudiantes quase bateu o Barcelona fazendo faltas, parando o jogo, tentando tirar o grupo de jogadores mais concentrado e focado da história do sério. Apertou a saída. Evidentemente que iria perder igual, mas de outra forma.

Agora sim para terminar, por mais que ache que há times melhores que o Santos na América como a Universidad de Chile que é o melhor, Vasco, Boca e até o Vélez, o Santos, mal ou bem, era, pelo menos oficialmente, o melhor time do continente. E, contra o Barcelona, fiquei com a certeza de que o melhor time do continente sul-americano disputaria rebaixamento em qualquer grande liga europeia.

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