domingo, 15 de março de 2009

Medelín V



Caros amigos, já tenho material suficiente para publicar mais um capítulo do meu diário do exílio. Antes, algumas correções a dados publicados num passado recente.

Declarei que em 50% dos casos, o povo aqui não coloca o pisca-pisca, mas estava equivocado. Eles não colocam o dito cujo em cerca de 90% dos casos, pisca-pisca é simplesmente para celebrações creio eu, na cabeça deles. Luzes de Natal, talvez.

Bom, agora saciarei a curiosidade de vocês que devem estar se perguntando sobre o que é essa coisa horrenda que aparece na foto em anexo. Antes, com dor no coração (ou no estômago?) digo que essa foi a “carne” de meus dois últimos almoços.

Aproveito a ocasião e proponho uma pesquisa: o que vocês fariam com esse excremento:

a) Dariam para os cachorros;
b) Dariam para os porcos;
c) Colocariam na lata do lixo por serem defensores dos direitos dos animais;
d) Comeriam.

Aqui, a resposta certa é “d”. E mais ainda: esse negócio, chamado aqui de “chicharrones” é a picanha deles, ou seja, nada mais fabuloso quando o assunto é carne que essa agradável iguaria que consiste de 95% de gordura frita e dura com 5% de carne de porco seca e dura. Querem saber se eu sinto falta de um churrasco? Não queiram saber.

No Jornal Nacional deles, há avisos de placas de carros que foram roubados e conseqüentemente encontrados pela polícia.

No banheiro da rodoviária, paga-se $200 para entrar e mais $100 no caso de o usuário solicitar papel. Esses valores são o equivalente, mais ou menos, a R$0,20 e R$0,10.

Ainda na rodoviária, se alguém chegar em um ônibus e dizer que há outra pessoa à caminho, o motorista do veículo ignora a tabela de horários e espera o cidadão.

Aliás, a pontualidade colombiana é algo incrível. Resumindo, é a pontualidade britânica elevada a -1.

O sistema bancário é uma tristeza. Aqui quase não há operações de transferências bancárias via Internet, há sempre filas nas agências, Aliás, fazia quase 10 anos que não entrava numa agência bancária o que já fiz aqui algumas vezes. Por exemplo, se uma empresa que patrocina um espaço público tem que fazer o pagamento, alguém desse espaço público tem que ir até uma agência, retirar um cheque e depois depositá-lo.

Como será bom o dia em que o homem invente uma rede mundial de computadores em que se possa fazer de tudo...

A feiúra do povo começou a me espantar. Algumas voltas no centro da cidade me causaram esse mal-estar. Mesmo em xópins, anda-se e anda-se e não se vê beleza.

Muitos homens aqui usam uns colares de pedras brilhantes, como de mulheres, com uma cruz suspensa abaixo. De doer.

Há um grande número de pequenos estabelecimentos como lancherias e bares ou pessoas mesmo nas ruas, que vendem minutos de celular, ou seja, se quiseres fazer uma ligação, aborde um desses cidadãos, realize a chamada e pague ao final. Os aparelhos são presos por uma corrente ao corpo dos empreendedores.

Em um xópim aqui há uma máquina espetacular. Há cabos para todos os modelos de celulares possíveis, e qualquer pessoa pode conectar seu aparelho e recarregá-lo sem custo algum.

As novelas e os telejornais aqui ainda me surpreendem. As primeiras, por sua quantidade e pelo vício das pessoas. Essas deixam de confraternizar com visitas para acompanhar os patéticos capítulos, com atores que conseguem ser muito piores que os daí e histórias que conseguem ser ainda mais estúpidas. Para quem conhece as novelas mexicanas transmitidas pelo Silvio aí, é exatamente a mesma coisa, os mesmos exageros, os mesmos excessos de maquiagem, as mesas tramas imbecis e galãs feios e de nomes compostos. Mas agora me referindo aos telejornais, é também incrível. Já por si só não sou um grande fã desse tipo de transmissão de notícias, mas, quando comparo os daqui com os de outros países do mundo, realmente chama a atenção. O Jornal Nacional deles, já citado no início do texto, tem o caráter de um jornal de cidade. As reportagens são, em sua maioria, factóides, buracos em ruas, falta de água em bairros, e, para piorar, cada matéria dura uma eternidades. São 10 minutos falando sobre uma infração de trânsito em alguma parte de Bogotá ou 12 minutos abordando a falta de água em uma cidade de aparência africana no interior do país, enfim, insuportável.

Nessas últimas semanas passei por algumas experiências bem animadoras. Fui convidado a uma festa de aniversário de uma guria de 10 anos, filha de uma funcionária da Marcela. Eles vivem em bairros localizados no alto das montanhas que rodeiam a cidade, ou seja, nas partes pobres da cidade. Para minha surpresa, foi nessa habitação popular que recebi o meu primeiro afago nos ouvidos, ou seja, música de verdade soava. Escutei “Rock The Casbah”, Jamiroquai, Metallica, Aerosmith, Guns N´Roses entre outros, estava realmente estarrecido.

Seguindo minhas experiências nas camadas populares, joguei minha primeira bola numa cancha de asfalto de um bairro popular. Muito bom o nível dos atletas, incrível como os goleiros se jogavam naquele chão desgraçado do de duro.

Hoje vi o outro lado, joguei meu segundo jogo, mas dessa vez com um time de brancos incluídos em canchas sintéticas de uma universidade. Aliás, faço parte de um time que hoje começou a disputa de um campeonato que durará três meses. Em relação ao nível, nem comparação. Hoje confirmei que, aqui, quem joga bola mesmo são os pobres, os incluídos são de doer. Goleiro ou zagueiros pegam a bola, balão pra frente. Não há troca de passes ou qualquer arremedo de jogada, de entristecer. Ainda comentei com a Marcela após o jogo, que pena que o povo lá do bairro popular não tem grana para participar desse campeonato, senão montava um time com eles na hora e ganhávamos esse torneio de olhos fechados e sem valer dar bomba nos brancos.

O outro ponto positivo ocorrido nas últimas foi semanas foi que encontrei um grupo de pessoas “anormais” e quando digo “anormais” é em relação às pessoas daqui. O namorado de uma amiga colombiana que conheci em Londres me convidou a conhecer seu grupo de amigos e fomos a um recinto em que, de fora, na chegada, o nome me surpreendeu: Rock Café. Logo, a primeira música que ouvi quando entrei era “Fade To Black”. Por mais que deteste bares, o fato de receber carinho nos tímpanos já era alguma coisa. Todas as pessoas presentes, além do melhor gosto musical, tinham assunto, era possível conversar desde algo estúpido como futebol até qualquer outra coisa, resumindo, era possível conversar, algo impossível e já descrito em textos anteriores: “te gusta montar a caballo, Eduardo?” ou então as 2h30min falando sobre o xou do cantor MEXICANO que está no texto do padre.

Bom, caros e saudosos leitores, era isso por hoje.

Um comentário:

Gustavo P. Alves disse...

Que belo texto, caro amigo!!!!

Tenho uma notícia... voltei ao velho Buk em grande estilo... A MULHER MAIS LINDA DA CIDADE!!! DEMAISS!!!