sexta-feira, 21 de janeiro de 2011

O Caso Ronaldinho

Muitas pessoas já me comentaram e pediram minha opinião sobre o novo caso Ronaldinho. Expressei-a em muitos grupos de discussões, e-mails, telefone, mas seguem me pedindo uma espécie de “formalização” de minha opinião. Não ia perder mais tempo de minha vida escrevendo sobre um jogador fantasia que jamais me atraiu e/ou me enganou, mas atenderei aos pedidos de algumas pessoas que insistem em se interessar por minhas opiniões.

A relação Ronaldinho – Grêmio pode ser dividida em três etapas: o surgimento dele no Olímpico e a rápida transformação em ídolo, a saída conturbada e repleta de acusações de traição e outras bobagens do gênero típicas de torcedores de futebol e o seu último e derradeiro (?) capítulo, essa volta ao Brasil e não ao Rio Grande do Sul. Partindo dessa estrutura de pensamento, farei minha humilde análise.

Jamais Ronaldinho me agradou como jogador. Nem nos seus tempos de Grêmio? Nem nos tempos de Barcelona? Exato. Jamais me agradou.

Vivemos em uma era chamada por muitos de pós-modernidade, por outras correntes de hipermodernidade, mas que, não importando a nomenclatura, é uma era do espetáculo, vivemos em uma sociedade do espetáculo como bem salientou o gênio suicida francês Guy Debord. O mundo atual depende de entretenimento e consequentemente de suas celebridades que são os avatares dessa máquina de diversão e espetáculo constantes que consumimos a cada segundo.

A imagem tem muito mais valor do que as palavras. No caso de Ronaldinho, lances “espetaculares” são muito mais importantes do que a objetividade, a produção, gols, passes para gol. Ronaldinho era, em sua época de Barcelona, uma celebridade “espetacular” do futebol, um dos campos de entretenimento mais importantes da sociedade mundial. Ronaldinho tinha como slogans “alegria”, “jogo bonito”, era uma espécie de gimmick da Nike e de seus demais patrocinadores.

Até eu volta e meia caio nas armadilhas das marcas. Paguei oito dólares por um café da Starbucks no aeroporto de Lima quando poderia conseguir o mesmo produto pela metade do preço. Gosto da Starbucks e do que representa a marca. No entanto, abri os olhos, não caio mais nessa.

Ronaldinho colocou todo mundo no bolso com sua plasticidade, sorrisos, jogadas improdutivas, mas belas e divertidas. No entanto, eu não engolia. Assim como defendo que qualquer xis vale mais à pena do que qualquer pão com um quilo de maionese e carne de rato do Mc Donald´s e custa um terço do preço. Não ângulo a fascinação criada pelo Mc Donald´s, compro e consumo produtos, não marcas.

No início desse milênio o jovem talento espetacular do futebol sul-americano recebia propostas pomposas do futebol europeu com boatos que afirmavam que essas quantias chegavam a exorbitantes 80 milhões de dólares. No mesmo período o ministro Pelé inventou uma lei para benefício próprio e prejudicial ao país que liberava os atletas para irem-se dos clubes sem ter que pagar nada. Era a nova lei do passe.

O incompetente presidente do Grêmio à época, talvez apostando que seria mais uma lei que não “pegaria” não quis vender o jogador. A lei entrou em vigor e Ronaldinho se foi de graça, deixando o clube que o projetou e que tirou sua família da pobreza sem
um tostão.

A reação da torcida gremista foi de ódio total contra quem teoricamente “traiu” os interesses do clube e jamais Ronaldinho foi perdoado.

Mais uma vez eu vou contra a opinião reinante e afirmo que toda essa reação odiosa da torcida foi hipócrita.

Qualquer ser humano normal preferiria ir-se com 80 milhões no bolso do que com “míseros” 10%. Não foram 80 milhões? Não interessa o valor, qualquer ser humano optaria por 100% de um valor altíssimo do que ser “honesto” e sair com apenas 10%. Ronaldinho não foi desonesto; apenas seguiu a (nova) lei de Pelé, o mesmo que hoje o acusa de mercenário por não ter ido jogar no Grêmio.

Depois de seus anos dourados de Barcelona Ronaldinho acabou no AC Milan, clube que vem tendo a filosofia humanística de apostar em jogadores decadentes e problemáticos como Ronaldo, Robinho e, claro, Ronaldinho. O AC Milan fez seu papel de centro de reabilitação e abriu as portas para o ex-barcelonista. Depois de muitos anos, desde os tempos de Paris SG, Ronaldinho foi jogador de futebol por cima de sua faceta de celebridade do entretenimento dentro de campo. O seu rendimento foi questionado pela maioria, muitas vezes experimentou o dissabor do banco de reservas, chegou a disputar o ingrato título de pior jogador do Calcio que por sorte não o conquistou pela nobre presença de Adriano no futebol italiano e acabou sua trajetória rossoneri de maneira melancólica, sendo reserva absoluto.

Mais uma vez contrario a tudo e a todos e afirmo que sua participação no AC Milan foi a melhor de sua carreira. Evidentemente que na última temporada o jogador não tinha as mínimas condições, mas nas duas temporadas anteriores teve boas participações e até merecia ter ido à África do Sul. Já sem os holofotes em cima e sem físico para grandes malabarismos, Ronaldinho se transformou, depois de velho, em jogador de futebol e finalmente conseguiu aproveitar sua abundante técnica.
Infelizmente o fez demasiado tarde quando seu corpo já não agüenta mais os maus tratos recebidos.

E Ronaldinho decidiu voltar ao Brasil. De cara a torcida gremista mostrou o seu “fisiologismo” de princípios e abriu as pernas e os corações para a volta do filho da casa. Todo o ódio foi deixado de lado e só o que se ouvia eram votos de amor ao ex-traidor que vinha retratar-se em solo gaúcho.

As negociações eram dadas como avançadas, a concorrência era menosprezada e tudo isso porque Ronaldinho é gremista, queria voltar, amava o clube. Eu, assim que começaram os boatos de que Ronaldinho queria voltar ao Brasil, antes de sequer o nome do Grêmio ser mencionado, disse: o Flamengo é a cara dele, que vá ao time da Gávea.

A minha premonição era correta. Ronaldinho, apesar de todo o esforço da diretoria atual do Grêmio optou pelo Flamengo pelo simples motivo de que o Grêmio não quis o contrato com salário fixo de mais de um milhão de reais por mês como queria Assis e sim um esquema de salários progressivos, talvez pelo temor de um fracasso total do atleta no Olímpico. Ronaldinho optou pelo Flamengo por dinheiro.

O futebol está cada vez mais profissional e é difícil de encontrar casos, pelo menos no futebol brasileiro, de atletas identificados com seus clubes. Há exemplos pelo mundo afora como Gerrard, Riquelme, entre outros, mas é algo raro e não pode ser criticado. O futebol é profissional bem como são os atletas que jogam por dinheiro, jogam porque é uma profissão.

No entanto há enormes diferenças entre o caso de Ronaldinho saindo do Grêmio e indo
para a Europa de graça do que com esse retorno fracassado de 2010. Naquela época Ronaldinho era ninguém e não poderia abrir mão de uma fortuna jamais vista por suposto amor ao clube; hoje, Ronaldinho é um homem milionário e sim poderia, ou melhor dizendo, caso fosse realmente torcedor do Grêmio com vontade de conseguir o perdão de sua própria torcida, abrir mão de “pequenas” diferenças econômicas e ir pro Olímpico. Ronaldinho não o fez pelo simples motivo de que não é um torcedor do Grêmio e jamais o foi. O criticaria caso ele fosse torcedor e assim mesmo optasse pelo Flamengo por alguns mil reais a mais, mas não o posso fazer considerando que não é torcedor do Grêmio, que não há vínculos maiores com o Tricolor. Analisando dessa forma, Ronaldinho foi profissional e optou pela empresa que mais aportes financeiros lhe proporcionaria.

O resultado dessa novela foi extremamente positivo. O Grêmio livrou-se da ameaça de ter um grupo que terminou a temporada de excelente maneira, sem problemas (aparentes) internos e ainda por cima não terá a pressão de pagar um contrato mais caro que todos os demais contratos de todos os outros jogadores do grupo. O ponto negativo foi o atraso em relação a outras contratações muito mais urgentes e a vergonhosa cena das caixas de som sendo retiradas melancolicamente do gramado do Olímpico, cena digna de administração Obino. Ficou a lição e a minha voraz crítica à torcida gremista que não demonstrou dignidade e aceitou a quem supostamente a traiu de maneira “imperdoável”.

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