sábado, 22 de dezembro de 2012

Madonna, Arena, Cachorros e O Hiper-Modernismo

Com certo atraso venho à tona falar do xou da Madonna em Porto Alegre e da despedida do Olímpico. Aproveito para falar também de cachorros, a paixão mundial e da nossa era que, pelo visto, seguirá após o fracasso do fim do mundo. O xou da Madonna e a destruição do estádio Olímpico e sua futura substituição pela moderna, iluminada e arrogante Arena são dois marcos da nossa sociedade. Um caso é pontual, o caso do estádio, obra de concreto, física; o outro é simplesmente psicológico, mas não menos importante. Comecemos pela Madonna, primeiro as damas e, sem pesquisar antes, acho que a Madonna é mais velha que o Olímpico, então respeito aos mais velhos. Madonna foi, durante décadas, um símbolo da cultura popular, um mito do entretenimento. Foi, assim como Michael Jackson, pioneira em muitas coisas que fez e/ou produziu. Madonna, a cada semana, chocava o mundo com seu estilo provocativo de mulher rebelde e enigmática. Michael Jackson, antes de suas polêmicas relacionadas às crianças, inovava a cada novo trabalho, mas sempre com mais evidência na sua arte; Madonna, por outro lado, era a pivô de escândalos comportamentais que sempre conseguiam se reproduzir e continuar surpreendendo a sua imensa audiência. Madonna se renovava e sempre conseguia impressionar por sua ousadia e coragem. Vocês não vão acreditar! A Madonna beijou uma MULHER na boca em pleno palco! A Madonna beijou a figura de um Jesus Cristo negro! Essas duas safadezas da vovó Madonna hoje não impressionariam nem o mais pudico dos mortais. Madonna ficou para trás. Madonna surpreende mais ninguém, o mito, não por falta de talento ou ousadia, acabou e acabou pela concorrência desleal. Madonna nunca será rebaixada ao esquecimento porque, como dizem os marqueteiros, o primeiro a fazer alguma coisa sempre será lembrado, mais até do que o que faz tal coisa melhor, mas Madonna já não exerce fascinação, pois as gerações crescem e os novos ícones do entretenimento, com mais ou menos talento, se vulgarizam cada vez mais e conquistam a atenção do grande público. Lady Gaga é a nova Madonna? Não, não acho que tenhamos uma “nova Madonna” e sim um novo estilo. Dificilmente nos deixamos, atualmente, impressionar por qualquer forma de comportamento ou qualquer forma de arte. Há algumas semanas atrás um psicopata invade uma escola e mata mais de 20 crianças entre seis e oito anos; o mundo se surpreende (cada vez menos, considerando que isso já havia acontecido 40 vezes antes apenas no Estados Unidos), mas esquecerá e o fará bem rápido. A nossa era não é fiel. Temos sentimentos fisiológicos. O que é espetacular hoje, é condenado ao ostracismo amanhã, estará, como dizem os mais afetados, “out”, temos sede de novidades e pouca fidelidade para tudo. O beijo de Madonna na boca de uma pessoa do mesmo sexo em público já está vulgarizado. Isso acontece em séries bem educadinhas como Gray`s Anatomy a cada episódio e tira o sono de ninguém, não consegue nem excitar aos mais depravados. Jogar-se em cima do público, os devaneios de festivais como Woodstock, não, nada disso chamaria mais a atenção hoje. Madonna beijou um Jesus negro? Ok, Marylin Mason É o demônio e Paris Hilton divulgou sem dó nem piedade uma noite sua de paixão na Internet para qualquer vivente ver. Não dá mais para competir. O Olímpico também não pode mais competir. Doa a quem doer, o Olímpico poderia ser considerado um vestígio de uma civilização antiga, praticamente uma pirâmide egípcia ou um coliseu romano. Era uma verdadeira vergonha que um lugar com essas condições, onde pessoas que pagam mais caro que frequentadores de cinema e teatros, sentem no chão, tomem chuva na cabeça, usem banheiros de animais e comam lixo. Vale lembrar que o Olímpico, quando construído nos anos 50, era sinônimo de avanço tecnológico e hoje eu considero absurdo que possa receber eventos dessa natureza. O Olímpico será substituído, aliás, já foi, e nada mais apropriado do que ter seu último evento com outro símbolo do passado, “construído” na mesma época e que também tende a desaparecer aos poucos. Quem chega para tomar o lugar de Madonna e dos velhos e antiquados estádios de futebol gaúchos e brasileiros são símbolos da nossa atualidade, estádios repletos de luzes, de neons, de pirotecnias; jovens artistas cheios de ideias mais mirabolantes, na maioria das vezes ideias estas que fogem do propósito da arte e se focam exclusivamente nas tentativas de deixar uma imagem marcante que dure, pelo menos, uma semana, até algum outro aparecer com algo novo, com um xou 360° ou que coma um animal vivo no palco. Madonna e Olímpico são símbolos de uma época em que cachorro era bicho, e não parte da família, onde crianças eram vítimas de ataques de cachorros e não acusados de terem provocado o pitbull que nunca havia atacado alguém, onde as mulheres ainda pensavam em constituir uma família antes de pensar em competir com o homem, colocar silicone ou tornar a sua vida profissional o ponto mais importante de suas tristes vidas. Eu não gosto da Madonna, mas a respeito por pioneira. Mais do que um símbolo homossexual repugnante, se analisamos a carreira da coroa, podemos considerá-la importante para a arte do século XX. Se então compararmos a sua produção musical com o que o mundo “pop” produz hoje, Madonna era melhor e mais versátil. Sobre o Olímpico, lá tive boas memórias, foi o primeiro estádio que eu entrei e, lá dentro, me apaixonei por um clube de futebol, algo que, se pensamos faz sentido nenhum. No entanto, Madonna e Olímpico dão adeus e cedem seus lugares ao atual, ao “in”, ao novo, efêmero e fugaz.

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