sábado, 31 de janeiro de 2015

A Diminuição da Torta

Na semana passada me surpreendi pela falta de espaço que uma notícia, na verdade o resultado de uma pesquisa, teve, ou melhor, não teve na mídia brasileira. Não vou negar que vi a notícia em alguns meios, mas sempre pequena e escondida entre outras tantas menos importantes.

A OXFAM que é uma organização com atuação em cerca de 90 países e que tem como principal objetivo a luta contra a pobreza, divulgou, em seu último estudo, que a população 1% mais rica do planeta irá, prontamente, possuir mais riquezas do que todo o resto da população mundial. Repito: quem fez o estudo foi a OXFAM usando dados do banco Credit Suisse, não foi o governo de Cuba ou da Venezuela.

Primeiramente devo repetir pela enésima vez que considero o capitalismo a menos pior entre todas as doutrinas e o principal motivo é que o capitalismo é a única forma de pensar que considera a genética humana, mais especificamente o desejo intrínseco da maioria dos humanos por acumular propriedades. Qualquer doutrina que ignora ou tenta abafar essa característica inegável, tende a fracassar. No entanto, sou um dos primeiros a criticar a forma com que o capitalismo é gerido em grande parte de nossa sociedade. A turma de Miami que está nem aí para os 99% de baixo, de bate-pronto rebatem: “esses 1% tem o direito de estar onde estão e aí estão por méritos próprios já que todos nós temos as mesmas condições”.

O contra-argumento proveniente de Miami me faz pensar: será mesmo que temos as mesmas condições? Será que um sistema que permite que 1% possua mais do que o resto da plebe junta é assim tão perfeito? Será realmente que o Estado jamais deverá intervir nos rumos da economia globalizada mundial já que essa engrenagem é vista como perfeita e imperturbável pela elite desse planeta? Uma vez li uma declaração de Warren Buffet, um dos homens mais ricos do mundo. Dizia ele que pagava menos impostos que sua secretária. Será esse um mecanismo justo? Seguindo lendo o artigo da OXFAM e outro dado me surpreendeu ainda mais: 85 pessoas possuem mais riqueza que 50% da população mundial. São 85 pessoas contra quatro bilhões de pessoas, meus amigos. Será que esse sistema realmente é assim tão imaculado? Miami diz que um sistema não pode evitar que estas 85 pessoas brilhantes sejam prejudicadas, pois isso seria ir contra a evolução de nossa sociedade, pois impediríamos as mentes brilhantes de brindar o mundo com suas genialidades. Será?

Para mim economia é um dos temas mais complicados de entender entre tantos temas. Lendo artigos sobre a teoria da relatividade, mais ou menos entendi pelo menos o núcleo da teoria. No entanto a economia, para mim, é um mistério. Soluciono isso lendo pessoas que entendem, como quase todos os Nobel de economia dos anos recentes. Saliento aqui que o autor da pesquisa não foi o governo de Cuba ou da Coreia do Norte e não estou dizendo aqui que leio Marx ou Engels. Refiro-me aos mais recentes ganhadores dos prêmios Nobel de economia como, por exemplo, Joan Tirole, o atual ganhador, que tem como foco de suas pesquisas os monopólios. Resumindo as ideias desses caras de uma forma lúdica, dizem eles que o acúmulo de capitais é um dos fatores que impede o crescimento econômico, pois o que diz a turma de Miami de que esses capitais inevitavelmente voltam à sociedade é uma mentira. Volto ao estudo da OXFAM que diz que nos últimos anos aumentou de forma progressiva a porcentagem pertencente ao grupo dos mais ricos, ou seja, em outras palavras, a “torta” não aumenta, pois o crescimento é travado pela disparidade, mas aumenta o pedaço desse 1%. 

O resultado é cada vez menos “torta” para 99% da população mundial. Os 1% comem mais torta e deixam cada vez menos migalhas para a cachorrada.

Usando agora o método da comparação, vejamos quais são os dez países mais desiguais do planeta: República Centro-Africana, Serra Leoa, Congo, Níger, Chade, Guiné-Bissau, Guiné, Burkina Faso, Burundi, Libéria e Moçambique. Os dez com melhor distribuição de renda são: Noruega, Austrália, Holanda, Suíça, Alemanha, Islândia, Suécia, Dinamarca, Canadá e Irlanda. Pergunta difícil: onde preferiríamos morar, na Noruega ou na República Centro-Africana? Se pudéssemos escolher, gostaríamos de um mundo mais parecido a Serra Leoa ou à Austrália?

O grande problema é que os beneficiados pela desigualdade são os detentores do poder em países onde esse problema é grave e jamais mudarão esta situação, pois não lhes convém. Um dado interessante: nos últimos quatro anos, onde o mercado global padeceu com a grande crise econômica, as 80 pessoas mais ricas do mundo aumentaram suas riquezas em 600 bilhões de dólares. Se esse sistema fosse assim tão perfeito e justo como muitos defendem, não seria lógico que todos perdessem juntos nesses quatro anos em valores proporcionais? Não seria mais coerente que estivéssemos, plebeus e G80 juntos na saúde e na doença, na felicidade e na tristeza? Pois esses cidadãos que estão entre os 50% mais pobres do mundo PERDERAM 750 bilhões de dólares no mesmo período.

Outra consequência da crise econômica causada, diga-se de passagem, não pela plebe mundial e sim pelo avarento e desregulado sistema financeiro, é a tal “austeridade” imposta por muitos países europeus. Direitos milenares que sempre garantiram a altíssima qualidade de vida dos europeus estão sendo questionados em muitos destes países. A solução para a crise causada pelos abutres foi cortar benefícios dos 99% e, claro, diminuir impostos e facilitar a vida dos criminosos 1%. Vale lembrar que o governo americano em seus planos de resgates de bancos que são as organizações criminosas mais podres da Terra, fez jorrar bilhões e bilhões de dólares nas contas destes que, na maior cara de pau, com esse dinheiro pagaram bônus recordes aos seus executivos pelos “bons” trabalhos prestados, como quebrar a economia mundial e países inteiros como a Grécia e o Chipre, por exemplo. E esse mesmo governo americano não é capaz, ainda, de dar saúde grátis a sua população mesmo sendo a maior economia de todas. Premiam-se os culpados e punem-se as vítimas. Nesses momentos não posso deixar de citar o governo islandês que, após a crise de 2008, colocou na cadeia a maioria dos banqueiros de seu país por crimes financeiros e trata-se de um país que tem o sistema bancário como seu carro-forte econômico.


Obama, para dar um pouco de esperança a todos como eu que não confiam nos atos da elite, anuncia aumentos de impostos para as grandes riquezas americanas em uma tentativa de aliviar a carga cada vez mais dura que paira sobre as costas da classe média americana. Medidas como essa são prontamente rechaçadas pela elite brazuca miamista que detesta ver rico sofrer e pagar impostos. 

Acusa que tudo vai parar nos bolsos de políticos corruptos. Classe média conservadora brazuca que se preze detesta ver gente metendo o bedelho em grandes fortunas ou em grandes meios de comunicação. E também acabamos de assistir a vitória de um partido na Grécia que promete descumprir com os acordos que têm a Grécia enforcada e sua população atolada em 25% de desemprego e 50% entre jovens. O que acontecerá? Paguemos para ver.

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